Por ANA MARIA TEODORO MASSUCI
Puséramo-nos a caminho e, a breves minutos, estacionávamos
diante dum edifício de vastas proporções.
O colega, gentil, conduziu-nos ao interior de espaçoso
necrotério, onde defrontamos um quadro interessante,
O cadáver de uma jovem, de menos de trinta anos, ali jazia
gelado e rígido, tendo a seu lado uma entidade masculina, em
atitude de zelo.
Com assombro, notei que a desencarnada estava unida aos
despojos. Parecia recolhida a si mesma, sob forte impressão de terror.
Cerrava as pálpebras, deliberadamente, receosa de olhar em torno.
– Terminou o processo de desligamento dos laços fisiológicos–exclamou o
facultativo atento –, mas a pobrezinha há seis horas que está dominada
por terrível pavor. E apontando o cavalheiro desencarnado, que
permanecia junto dela, cuidadoso, o receitista esclareceu:
– Aquele é o noivo que a espera, há muito. Aproximamo-nos um tanto e ouvimo-lo exclamar carinhosamente: –
Cremilda! Cremilda! Vem! Abandona as vestes rotas. Fiz tudo
para que não sofresse mais... Nossa casinha te aguarda, cheia de amor e
luz!... A jovem, todavia, cerrava os olhos, demonstrando não querer
vê-lo. Notava-se, perfeitamente, que seu organismo espiritual
permanecia totalmente desligado do vaso físico, mas a pobrezinha
continuava estendida, copiando a posição cadavérica, tomada de infinito
horror.
Aniceto, que tudo pareceu compreender num abrir e fechar de olhos, fez leve sinal ao rapaz desencarnado, que se aproximou
comovido.
– É preciso atendê-la doutro modo
– disse o nosso orientador, resoluto –, vejo que a pobrezinha não dormiu no desprendimento e
mostra-se amedrontada por falta de preparação espiritual.
Não convém que o amigo se apresente a ela já, já... Não obstante o amor
que lhe consagra, ela não poderia revê-lo sem terrível comoção, neste
instante em que a mente
lhe flutua sem rumo...
– Sim – considerou ele, tristemente –, há seis horas
chamo-a sem cessar, identificando-lhe o terror.
Redargüiu Aniceto, conselheiral:
Ausência de preparação religiosa, meu irmão. Ela dormirá,
porém, e, tão logo consiga repouso, entregála-emos
aos seus cuidados. Por enquanto, conserve-se a alguma distância.
E fazendo-se acompanhar do facultativo, que assistira
espiritualmente a jovem nos últimos dias, aproximou-se
da recém desencarnada, falando com inflexão paternal:
– Vamos, Cremilda, ao novo tratamento. Ouvindo-o, a
moça abriu os olhos espantadiços e exclamou:
– Ah, doutor, graças a Deus! Que pesadelo horrível!
Sentia-me no reino dos mortos, ouvindo meu noivo, falecido há anos,
chamar-me para a Eternidade!...
–Não há morte, minha filha!–objetou Aniceto, afetuoso – creia na vida, na vida eterna, profunda, vitoriosa!
– É o senhor o novo médico?– indagou, confortada.
– Sim, fui chamado para aplicar-lhe alguns recursos em
bases magnéticas.
Torna-se indispensável que durma e descanse.
– É verdade... – tornou ela de modo comovente
–, estou muito cansada, necessitando de repouso...
Recomendou-nos o instrutor, em voz baixa, prestássemos auxílio, em
atitude íntima de oração, e, depois de conservar-se em silêncio por
instantes, ministrou-lhe
o passe reconfortador.
A jovem dormiu quase imediatamente. Deslocou-a
Aniceto, afastando-a dos despojos, com o zelo amoroso dum pai, e,
chamando o noivo reconhecido, entregou-a carinhosamente. – Agora,
poderá encaminhá-la, meu irmão.
O rapaz agradeceu com lágrimas de júbilo e vio retirar-se
de semblante iluminado, utilizando a volitação, a carregar
consigo o fardo suave do seu amor.
Nosso mentor fixou um gesto expressivo e falou:
- Pela bondade natural do coração e pelo espontâneo cultivo da virtude,
não precisará ela de provas purgatoriais. É de lamentar, contudo, não
se tivesse preparado na educação religiosa dos pensamentos. Em breve,
porém, terse-á adaptado à vida nova. Os bons não encontram obstáculos
insuperáveis.
E, desejoso talvez de consubstanciar a síntese da lição, rematou:
– Como vêem, a idéia da morte não serve para aliviar, curar ou
edificar verdadeiramente. É necessário difundir a idéia da vida
vitoriosa. Aliás, o Evangelho já nos ensina, há muitos séculos,
que Deus não é Deus de mortos e, sim, o Pai das criaturas que vivem para sempre.
Fonte - Os Mensageiros, psicografia Chico Xavier, pelo espírito André Luiz, trecho do Cap.48 "Pavor da Morte"
Nota do administrador do Farol
Este exemplo de Cremilda é instrutivo para todos nós, ela tinha uma boa
natureza, assim foi assistida pelo esposo e Aniceto, mas o pavor da
morte, a ideia que a morte representa o fim, o nada a extinção da vida,
dificultou o seu desprendimento, fez com que recusa-se a encarar a nova
situação agarrando-se ao corpo físico já sem vida.
No livro O
Céu e o Inferno, Allan Kardec, tem exemplos muito instrutivos de
espíritos sem formação e conhecimento espiritual, presos ao corpo físico
e sentindo a decomposição do mesmo, pois enquanto encarnados levaram
vidas materialistas, assim seu perispirito leva muito tempo para
desprender-se do físico, trazendo sofrimento para o espírito que sente
os horrores da decomposição, pois agarram-se aquilo que conhecem neste
caso o corpo físico, sentem afinidade com a matéria corporal, em suma
quanto mais espiritualizado mais rápido o desprendimento.
Na
obra: Legião - Um Olhar Sobre o Reino das Sombras (psicografia Robson
Pinheiro - ditado pelo espírito Ângelo Inácio, é relatada uma situação
de uma modelo, que em vida se apegou à beleza física, sua preocupação
era o culto do corpo acima de tudo, aconteceu que quando desencarnou
ficou presa ao corpo em decomposição, durante vinte anos, por se recusar
a abandonar o objecto de sua predilecção. Só com ajuda de sua avó e da
doação de ectoplasma, trabalhado por espíritos elementais (espíritos da
natureza1) doado por um médium desdobrado foi possível tira-lá de sua
sepultura.
Importante conhecermos o mundo espiritual, irmos nos
habituando à ideia de que podemos desencarnar a qualquer momento, lermos
as obras que nos descrevem a vida espiritual e compreendermos que
recebemos o que tivermos dado. Façamos o nosso melhor ao nosso alcance e
sustentemos a certeza de que quando nosso momento chegar, não haverá
razões para termos pavor da "morte". Esse pavor, o medo de morrer é um
obstáculo a que o perispirito se desprenda mais rapidamente do corpo
físico.Para aquele que tem a consciência tranquila não há o que temer,
pois que amigos, familiares, e nosso guia ajudam no processo de
desligamento do perispirito e nos ajudam a ambientar mais rapidamente à
nova vida. Devemos ir-nos mentalizando e compreendermos que a morte não é
um mal, mas apenas mudança de dimensão, plano. Devemos ir-nos
habituando a nos desprender dos bens materiais, a nos desligar do apego
as coisas terrenas e afeiçoarmos aos valores espirituais, assim nosso
desprendimento será mais suave e mais rápido por já nos identificarmos
com a nova situação depois da "morte"
1.Espíritos Elementais ou
Espíritos da Natureza - ver O Livro dos Espíritos, no cap.IX "Da
intervenção dos Espíritos no mundo corporal" - Ação dos Espíritos sobre
os fenômenos da Natureza
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