Autor: Allan Kardec
Questão 872 de O Livro dos Espíritos.
A questão do livre-arbítrio se pode
resumir assim:
O homem não é
fatalmente levado ao mal; os atos que
pratica não foram previamente
determinados; os crimes que comete não
resultam de uma sentença do destino.
Ele pode, por prova e por expiação,
escolher uma existência em que seja
arrastado ao crime, quer pelo meio
onde se ache colocado, quer pelas
circunstâncias que sobrevenham, mas
será sempre livre de agir ou não agir.
Assim, o livre-arbítrio existe para
ele, quando no estado de Espírito, ao
fazer a escolha da existência e das
provas e, como encarnado, na faculdade
de ceder ou de resistir aos
arrastamentos a que todos nos temos
voluntariamente submetido. Cabe à
educação combater essas más
tendências. Fá-lo-á utilmente, quando
se basear no estudo aprofundado da
natureza moral do homem. Pelo
conhecimento das leis que regem essa
natureza moral, chegar-se-á a
modificá-la, como se modifica a
inteligência pela instrução e o
temperamento pela higiene.
Desprendido da matéria e no estado de
erraticidade, o Espírito procede à
escolha de suas futuras existências
corporais, de acordo com o grau de
perfeição a que haja chegado e é
nisso, como temos dito, que consiste
sobretudo o seu livre-arbítrio. Esta
liberdade, a encarnação não a anula.
Se ele cede à influência da matéria, é
que sucumbe nas provas que por si
mesmo escolheu. Para ter quem o ajude
a vencê-las, concedido lhe é invocar a
assistência de Deus e dos bons
Espíritos. (337)
Sem o livre-arbítrio, o homem não
teria nem culpa por praticar o mal,
nem mérito em praticar o bem. E isto a
tal ponto está reconhecido que, no
mundo, a censura ou o elogio são
feitos à intenção, isto é, à vontade.
Ora, quem diz vontade diz liberdade.
Nenhuma desculpa poderá, portanto, o
homem buscar, para os seus delitos, na
sua organização física, sem abdicar da
razão e da sua condição de ser humano,
para se equiparar ao bruto. Se fora
assim quanto ao mal, assim não poderia
deixar de ser relativamente ao bem.
Mas, quando o homem pratica o bem, tem
grande cuidado de averbar o fato à sua
conta, como mérito, e não cogita de
por ele gratificar os seus órgãos, o
que prova que, por instinto, não
renuncia, mau grado à opinião de
alguns sistemáticos, ao mais belo
privilégio de sua espécie: a liberdade
de pensar.
A fatalidade, como vulgarmente é
entendida, supõe a decisão prévia e
irrevogável de todos os sucessos da
vida, qualquer que seja a importância
deles. Se tal fosse a ordem das
coisas, o homem seria qual máquina sem
vontade. De que lhe serviria a
inteligência, desde que houvesse de
estar invariavelmente dominado, em
todos os seus atos, pela força do
destino? Semelhante doutrina, se
verdadeira, conteria a destruição de
toda liberdade moral; já não haveria
para o homem responsabilidade, nem,
por conseguinte, bem, nem mal, crimes
ou virtudes. Não seria possível que
Deus, soberanamente justo, castigasse
suas criaturas por faltas cujo
cometimento não dependera delas, nem
que as recompensasse por virtudes de
que nenhum mérito teriam. Demais, tal
lei seria a negação da do progresso,
porquanto o homem, tudo esperando da
sorte, nada tentaria para melhorar a
sua posição, visto que não conseguiria
ser mais nem menos.
Contudo, a fatalidade não é uma
palavra vã. Existe na posição que o
homem ocupa na Terra e nas funções que
aí desempenha, em conseqüência do
gênero de vida que seu Espírito
escolheu como prova, expiação ou
missão. Ele sofre fatalmente todas as
vicissitudes dessa existência e todas
as tendências boas ou más, que lhe são
inerentes. Aí, porém, acaba a
fatalidade, pois da sua vontade
depende ceder ou não a essas
tendências. Os pormenores dos
acontecimentos, esses ficam
subordinados às circunstâncias que ele
próprio cria pelos seus atos, sendo
que nessas circunstâncias podem os
Espíritos influir pelos pensamentos
que sugiram. (459)
Há fatalidade, portanto, nos
acontecimentos que se apresentam, por
serem estes conseqüência da escolha
que o Espírito fez da sua existência
de homem. Pode deixar de haver
fatalidade no resultado de tais
acontecimentos, visto ser possível ao
homem, pela sua prudência, modificar-
lhes o curso. Nunca há fatalidade nos
atos da vida moral. No que concerne à
morte é que o homem se acha submetido,
em absoluto, à inexorável lei da
fatalidade, por isso que não pode
escapar à sentença que lhe marca o
termo da existência, nem ao gênero de
morte que haja de cortar a esta o fio.
Segundo a doutrina vulgar, de si mesmo
tiraria o homem todos os seus
instintos que, então, proviriam, ou da
sua organização física, pela qual
nenhuma responsabilidade lhe toca, ou
da sua própria natureza, caso em que
lícito lhe fora procurar desculpar-se
consigo mesmo, dizendo não lhe
pertencer a culpa de ser feito como é.
Muito mais moral se mostra,
indiscutivelmente, a Doutrina
Espírita. Ela admite no homem o livre-
arbítrio em toda a sua plenitude e, se
lhe diz que, praticando o mal, ele
cede a uma sugestão estranha e má, em
nada lhe diminui a responsabilidade,
pois lhe reconhece o poder de
resistir, o que evidentemente lhe é
muito mais fácil do que lutar contra a
sua própria natureza. Assim, de acordo
com a Doutrina Espírita, não há
arrastamento irresistível: o homem
pode sempre cerrar ouvidos à voz
oculta que lhe fala no íntimo,
induzindo-o ao mal, como pode cerrá-
los à voz material daquele que lhe
fale ostensivamente. Pode-o pela ação
da sua vontade, pedindo a Deus a força
necessária e reclamando, para tal fim,
a assistência dos bons Espíritos. Foi
o que Jesus nos ensinou por meio da
sublime prece que é a oração
dominical, quando manda que digamos:
“Não nos deixes sucumbir à tentação,
mas livra-nos do mal.” Essa teoria da
causa determinante dos nossos atos
ressalta com evidência de todo o
ensino que os Espíritos hão dado. Não
só é sublime de moralidade, mas
também, acrescentaremos, eleva o homem
aos seus próprios olhos. Mostra-o
livre de subtrair-se a um jugo
obsessor, como livre é de fechar sua
casa aos importunos. Ele deixa de ser
simples máquina, atuando por efeito de
uma impulsão independente da sua
vontade, para ser um ente racional,
que ouve, julga e escolhe livremente
de dois conselhos um. Aditemos que,
apesar disto, o homem não se acha
privado de iniciativa, não deixa de
agir por impulso próprio, pois que, em
definitiva, ele é apenas um Espírito
encarnado que conserva, sob o
envoltório corporal, as qualidades e
os defeitos que tinha como Espírito.
Conseguintemente, as faltas que
cometemos têm por fonte primária a
imperfeição do nosso próprio
Espírito,que ainda não conquistou a
superioridade moral que um dia
alcançará, mas que, nem por isso,
carece de livre-arbítrio. A vida
corpórea lhe é dada para se expungir
de suas imperfeições, mediante as
provas por que passa, imperfeições
que, precisamente, o tornam mais fraco
e mais acessível às sugestões de
outros Espíritos imperfeitos, que
delas se aproveitam para tentar fazê-
lo sucumbir na luta em que se
empenhou. Se dessa luta sai vencedor
ele se eleva; se fracassa, permanece o
que era, nem pior, nem melhor. Será
uma prova que lhe cumpre recomeçar,
podendo suceder que longo tempo gaste
nessa alternativa.
Quanto mais se depura, tanto mais
diminuem os seus pontos fracos e tanto
menos acesso oferece aos que procurem
atraí-lo para o mal. Na razão de sua
elevação, cresce-lhe a força moral,
fazendo que dele se afastem os maus
Espíritos.
Todos os Espíritos, mais ou menos
bons, quando encarnados, constituem a
espécie humana e, como o nosso mundo é
um dos menos adiantados, nele se conta
maior número de Espíritos maus do que
de bons.
Tal a razão por que aí vemos
perversidade. Façamos, pois, todos os
esforços para a este planeta não
voltarmos, após a presente estada, e
para merecermos ir repousar em mundo
melhor, em um desses mundos
privilegiados, onde não nos
lembraremos da nossa passagem por
aqui, senão como de um exílio
temporário.
terça-feira, 28 de fevereiro de 2017
REENCARNAÇÃO
“A reencarnação é a volta da alma
ou Espírito à vida corpórea, mas em outro
corpo especialmente formado para ele e que nada tem de comum
com o antigo”. (Allan Kardec, O Evangelho Segundo o
Espiritismo, cap. IV). Assim, não é invenção
do Espiritismo, mas sim algo natural, de modo que foi um tema
muito discutido e difundido ao longo da História da
Humanidade por muitos muitos pensadores, tais como Sócrates,
Pitágoras, Platão, Apolônio e Empédocles.
Jesus – o Incomparável, o Mestre, o único Guia e Modelo -, em várias oportunidades afirmou a existência da reencarnação
Em João (capítulo III, versículos de 1 a 12), encontramos a elucidativa palestra de Jesus com Nicodemos (doutor da lei judeu):
Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade vos digo que ninguém pode ver o reino de Deus se não nascer de novo”.
Perguntou-lhe, então, Nicodemos: "Como pode nascer um homem já velho? Pode tornar a entrar no ventre de sua mãe, para nascer segunda vez?"
Jesus respondeu: Em verdade, em verdade vos digo que aquele que não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito. Não te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é nascer de novo. O vento assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; o mesmo se dá com todo aquele que é nascido do Espírito”.
“Como pode ser isso?”, disse-lhe Nicodemos.
Jesus, então, afirmou: “Tu és mestre de Israel e não sabes?”
Digo-te em verdade, em verdade, que não dizemos senão o que sabemos e que não damos testemunho, senão do que temos visto. Entretanto, não aceitas o nosso testemunho. - Mas, se não me credes, quando vos falo das coisas da Terra, como me crereis, quando vos fale das coisas celestiais?"
Também, veremos a referência de Jesus com relação a João Batista ser reencarnação de Elias, referência está que está contida em Mateus (capítulo XVII, versículos 10 a 13).
Os discípulos indagaram ao Mestre: “Por que, pois, dizem os escribas que é preciso que Elias venha primeiro?”
E Jesus respondeu-lhes: “É verdade que Elias deve vir e restabelecer as coisas; mas eu vos declaro que Elias já veio e não o conheceram, mas fizeram-lhe tudo o que quiseram. É assim que eles farão sofrer o Filho do Homem. Então os discípulos compreenderam que ele lhes falara de João Batista".
“Ora, desde o tempo de João Batista até o presente, o reino dos céus é tomado pela violência e são os violentos que o arrebatam; - pois que assim o profetizaram todos os profetas até João, e também a lei. - Se quiserdes compreender o que vos digo, ele mesmo é o EIias que há de vir. - Ouça-o aquele que tiver ouvidos de ouvir. (MATEUS, cap. XI, versículos de 12 a 15.)
“Se o princípio da reencarnação, conforme se acha expresso em S. João, podia, a rigor, ser interpretado em sentido puramente místico, o mesmo já não acontece com esta passagem de S. Mateus, que não permite equívoco: ELE MESMO é o Elias que há de vir. Não há aí figura, nem alegoria: é uma afirmação positiva. -"Desde o tempo de João Batista até o presente o reino dos céus é tomado pela violência." Que significam essas palavras, uma vez que João Batista ainda vivia naquele momento? Jesus as explica, dizendo: "Se quiserdes compreender o que digo, ele mesmo é o Elias que há de vir." Ora, sendo João o próprio Elias, Jesus alude à época em que João vivia com o nome de Elias. "Até ao presente o reino dos céus é tomado pela violência": outra alusão à violência da lei moisaica, que ordenava o extermínio dos infiéis, para que os demais ganhassem a Terra Prometida, Paraíso dos hebreus, ao passo que, segundo a nova lei, o céu se ganha pela caridade e pela brandura.
E acrescentou: Ouça aquele que tiver ouvidos de ouvir. Essas palavras, que Jesus tanto repetiu, claramente dizem que nem todos estavam em condições de compreender certas verdades”. (Allan Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo IV).
Jesus, tendo vindo às cercanias de Cezaréia de Filipe, interrogou assim seus discípulos: "Que dizem os homens, com relação ao Filho do Homem? Quem dizem que eu sou?" - Eles lhe responderam: "Dizem uns que és João Batista; outros, que Elias; outros, que Jeremias, ou algum dos profetas." - Perguntou-lhes Jesus: "E vós, quem dizeis que eu sou?" - Simão Pedro, tomando a palavra, respondeu: "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo." - Replicou-lhe Jesus: "Bem-aventurado és, Simão, filho de Jonas, porque não foram a carne nem o sangue que isso te revelaram, mas meu Pai, que está nos céus." (Mateus, cap. XI, versículos 13 a 17; Marcos, cap. VIII, versículos 27 a 30)
Ora, se os homens da época refletiam sobre que era Jesus, obviamente acreditavam na reencarnação.
“Aqueles do vosso povo a quem a morte foi dada viverão de novo; aqueles que estavam mortos em meio a mim ressuscitarão. Despertai do vosso sono e entoai louvores a Deus, vós que habitais no pó; porque o orvalho que cai sobre vós é um orvalho de luz e porque arruinareis a Terra e o reino dos gigantes.
(ISAÍAS, cap. XXVI, versículo 19)
“É também muito explícita esta passagem de lsaías: "Aqueles do vosso povo a quem a morte foi dada viverão de novo." Se o profeta houvera querido falar da vida espiritual, se houvera pretendido dizer que aqueles que tinham sido executados não estavam mortos em Espírito, teria dito: ainda vivem, e não: viverão de novo. No sentido espiritual, essas palavras seriam um contra-senso, pois que implicariam uma interrupção na vida da alma. No sentido de regeneração moral, seriam a negação das penas eternas, pois que estabelecem, em princípio, que todos os que estão mortos reviverão”. (Allan Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo IV)
14. Mas, quando o homem há morrido uma vez, quando seu corpo, separado de seu espírito, foi consumido, que é feito dele? -Tendo morrido uma vez, poderia o homem reviver de novo? Nesta guerra em que me acho todos os dias da minha vida, espero que chegue a minha transformação. (João, cap. XIV, versículos 10 a 14. Tradução de Le Maistre de Sacy.)
Quando o homem está morto, vive sempre; acabando os dias da minha existência terrestre, esperarei, porquanto a ela voltarei de novo. (ID. Versão da Igreja grega.)
15. Nessas três versões, o princípio da pluralidade das existências se acha claramente expresso. Ninguém poderá supor que João haja querido falar da regeneração pela água do batismo, que ele de certo não conhecia. "Tendo o homem morrido uma vez, poderia reviver de novo?" A idéia de morrer uma vez, e de reviver implica a de morrer e reviver muitas vezes. A versão da Igreja grega ainda é mais explícita, se é que isso é possível: "Acabando os dias da minha existência terrena, esperarei, porquanto a ela voltarei", ou, voltarei à existência terrestre. Isso é tão claro, como se alguém dissesse: "Saio de minha casa, mas a ela tornarei”.
"Nesta guerra em que me encontro todos os dias de minha vida, espero que chegue a minha transformação". João, evidentemente, pretendeu referir-se à luta que sustentava contra as misérias da vida. Espera a sua mutação, isto é, resigna-se. Na versão grega, esperarei parece aplicar-se, preferentemente, a uma nova existência: "Quando a minha existência estiver acabada, esperarei, porquanto a ela voltarei". João como que se coloca, após a morte, no intervalo que separa uma existência de outra e diz que lá aguardará o momento de voltar.
Nestas passagens, assim como em outras, fica muito clara a existência das reencarnações. Como diria o Mestre, “Ouça aquele que tem ouvidos para ouvir”.
Finalizando, em O Livro dos Espíritos, Kardec indaga na questão 132:
Qual o objetivo da encarnação dos Espíritos?
Resposta dos Espíritos Superiores:
"Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição. Para uns, é expiação; para outros, missão. Mas, para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal: nisso é que está a expiação. Visa ainda outro fim a encarnação: o de pôr o Espírito em condições de suportar a parte que lhe toca na obra da criação. Para executá-la é que, em cada minuto, toma o Espírito um instrumento, de harmonia com a matéria essencial desse mundo, a fim de aí cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. É assim que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta".
Jesus – o Incomparável, o Mestre, o único Guia e Modelo -, em várias oportunidades afirmou a existência da reencarnação
Em João (capítulo III, versículos de 1 a 12), encontramos a elucidativa palestra de Jesus com Nicodemos (doutor da lei judeu):
Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade vos digo que ninguém pode ver o reino de Deus se não nascer de novo”.
Perguntou-lhe, então, Nicodemos: "Como pode nascer um homem já velho? Pode tornar a entrar no ventre de sua mãe, para nascer segunda vez?"
Jesus respondeu: Em verdade, em verdade vos digo que aquele que não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito. Não te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é nascer de novo. O vento assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; o mesmo se dá com todo aquele que é nascido do Espírito”.
“Como pode ser isso?”, disse-lhe Nicodemos.
Jesus, então, afirmou: “Tu és mestre de Israel e não sabes?”
Digo-te em verdade, em verdade, que não dizemos senão o que sabemos e que não damos testemunho, senão do que temos visto. Entretanto, não aceitas o nosso testemunho. - Mas, se não me credes, quando vos falo das coisas da Terra, como me crereis, quando vos fale das coisas celestiais?"
Também, veremos a referência de Jesus com relação a João Batista ser reencarnação de Elias, referência está que está contida em Mateus (capítulo XVII, versículos 10 a 13).
Os discípulos indagaram ao Mestre: “Por que, pois, dizem os escribas que é preciso que Elias venha primeiro?”
E Jesus respondeu-lhes: “É verdade que Elias deve vir e restabelecer as coisas; mas eu vos declaro que Elias já veio e não o conheceram, mas fizeram-lhe tudo o que quiseram. É assim que eles farão sofrer o Filho do Homem. Então os discípulos compreenderam que ele lhes falara de João Batista".
“Ora, desde o tempo de João Batista até o presente, o reino dos céus é tomado pela violência e são os violentos que o arrebatam; - pois que assim o profetizaram todos os profetas até João, e também a lei. - Se quiserdes compreender o que vos digo, ele mesmo é o EIias que há de vir. - Ouça-o aquele que tiver ouvidos de ouvir. (MATEUS, cap. XI, versículos de 12 a 15.)
“Se o princípio da reencarnação, conforme se acha expresso em S. João, podia, a rigor, ser interpretado em sentido puramente místico, o mesmo já não acontece com esta passagem de S. Mateus, que não permite equívoco: ELE MESMO é o Elias que há de vir. Não há aí figura, nem alegoria: é uma afirmação positiva. -"Desde o tempo de João Batista até o presente o reino dos céus é tomado pela violência." Que significam essas palavras, uma vez que João Batista ainda vivia naquele momento? Jesus as explica, dizendo: "Se quiserdes compreender o que digo, ele mesmo é o Elias que há de vir." Ora, sendo João o próprio Elias, Jesus alude à época em que João vivia com o nome de Elias. "Até ao presente o reino dos céus é tomado pela violência": outra alusão à violência da lei moisaica, que ordenava o extermínio dos infiéis, para que os demais ganhassem a Terra Prometida, Paraíso dos hebreus, ao passo que, segundo a nova lei, o céu se ganha pela caridade e pela brandura.
E acrescentou: Ouça aquele que tiver ouvidos de ouvir. Essas palavras, que Jesus tanto repetiu, claramente dizem que nem todos estavam em condições de compreender certas verdades”. (Allan Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo IV).
Jesus, tendo vindo às cercanias de Cezaréia de Filipe, interrogou assim seus discípulos: "Que dizem os homens, com relação ao Filho do Homem? Quem dizem que eu sou?" - Eles lhe responderam: "Dizem uns que és João Batista; outros, que Elias; outros, que Jeremias, ou algum dos profetas." - Perguntou-lhes Jesus: "E vós, quem dizeis que eu sou?" - Simão Pedro, tomando a palavra, respondeu: "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo." - Replicou-lhe Jesus: "Bem-aventurado és, Simão, filho de Jonas, porque não foram a carne nem o sangue que isso te revelaram, mas meu Pai, que está nos céus." (Mateus, cap. XI, versículos 13 a 17; Marcos, cap. VIII, versículos 27 a 30)
Ora, se os homens da época refletiam sobre que era Jesus, obviamente acreditavam na reencarnação.
“Aqueles do vosso povo a quem a morte foi dada viverão de novo; aqueles que estavam mortos em meio a mim ressuscitarão. Despertai do vosso sono e entoai louvores a Deus, vós que habitais no pó; porque o orvalho que cai sobre vós é um orvalho de luz e porque arruinareis a Terra e o reino dos gigantes.
(ISAÍAS, cap. XXVI, versículo 19)
“É também muito explícita esta passagem de lsaías: "Aqueles do vosso povo a quem a morte foi dada viverão de novo." Se o profeta houvera querido falar da vida espiritual, se houvera pretendido dizer que aqueles que tinham sido executados não estavam mortos em Espírito, teria dito: ainda vivem, e não: viverão de novo. No sentido espiritual, essas palavras seriam um contra-senso, pois que implicariam uma interrupção na vida da alma. No sentido de regeneração moral, seriam a negação das penas eternas, pois que estabelecem, em princípio, que todos os que estão mortos reviverão”. (Allan Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo IV)
14. Mas, quando o homem há morrido uma vez, quando seu corpo, separado de seu espírito, foi consumido, que é feito dele? -Tendo morrido uma vez, poderia o homem reviver de novo? Nesta guerra em que me acho todos os dias da minha vida, espero que chegue a minha transformação. (João, cap. XIV, versículos 10 a 14. Tradução de Le Maistre de Sacy.)
Quando o homem está morto, vive sempre; acabando os dias da minha existência terrestre, esperarei, porquanto a ela voltarei de novo. (ID. Versão da Igreja grega.)
15. Nessas três versões, o princípio da pluralidade das existências se acha claramente expresso. Ninguém poderá supor que João haja querido falar da regeneração pela água do batismo, que ele de certo não conhecia. "Tendo o homem morrido uma vez, poderia reviver de novo?" A idéia de morrer uma vez, e de reviver implica a de morrer e reviver muitas vezes. A versão da Igreja grega ainda é mais explícita, se é que isso é possível: "Acabando os dias da minha existência terrena, esperarei, porquanto a ela voltarei", ou, voltarei à existência terrestre. Isso é tão claro, como se alguém dissesse: "Saio de minha casa, mas a ela tornarei”.
"Nesta guerra em que me encontro todos os dias de minha vida, espero que chegue a minha transformação". João, evidentemente, pretendeu referir-se à luta que sustentava contra as misérias da vida. Espera a sua mutação, isto é, resigna-se. Na versão grega, esperarei parece aplicar-se, preferentemente, a uma nova existência: "Quando a minha existência estiver acabada, esperarei, porquanto a ela voltarei". João como que se coloca, após a morte, no intervalo que separa uma existência de outra e diz que lá aguardará o momento de voltar.
Nestas passagens, assim como em outras, fica muito clara a existência das reencarnações. Como diria o Mestre, “Ouça aquele que tem ouvidos para ouvir”.
Finalizando, em O Livro dos Espíritos, Kardec indaga na questão 132:
Qual o objetivo da encarnação dos Espíritos?
Resposta dos Espíritos Superiores:
"Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição. Para uns, é expiação; para outros, missão. Mas, para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal: nisso é que está a expiação. Visa ainda outro fim a encarnação: o de pôr o Espírito em condições de suportar a parte que lhe toca na obra da criação. Para executá-la é que, em cada minuto, toma o Espírito um instrumento, de harmonia com a matéria essencial desse mundo, a fim de aí cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. É assim que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta".
OBSESSÃO
"Entre os escolhos que apresenta a prática do
Espiritismo, cumpre se coloque na primeira linha a obsessão,
isto é, o domínio que alguns Espíritos
logram adquirir sobre certas pessoas. Nunca é praticada
senão pelos Espíritos inferiores, que procuram
dominar. Os bons Espíritos nenhum constrangimento infligem.
Aconselham, combatem a influência dos maus e, se não
os ouvem, retiram-se. Os maus, ao contrário, se agarram
àqueles de quem podem fazer suas presas. Se chegam
a dominar algum, identificam-se com o Espírito deste
e o conduzem como se fora verdadeira criança. A obsessão
apresenta caracteres diversos, que é preciso distinguir
e que resultam do grau do constrangimento e da natureza dos
efeitos que produz. A palavra obsessão é, de
certo modo, um termo genérico, pelo qual se designa
esta espécie de fenômeno, cujas principais variedades
são: a obsessão simples, a fascinação
e a subjugação. "(Allan Kardec, O Livro
dos Médiuns, capítulo XXIII).
Assim, tal fenômeno existiu em todas as épocas da humanidade, de tal modo que, na época de Jesus, usava-se o termo possessão para denominar os fenômenos de cunho obsessivo. Recordemo-nos de quando Jesus caminhava e deparou com um homem mentalmente perturbado. O homem inquiriu o Mestre: "quem és tu?"
Jesus respondeu: "Eu sou Jesus, e tu meu irmão, quem és?"
O homem, totalmente desequilibrado, disse: "Tu não, nós...nós somos legião". Jesus, sabendo perfeitamente que tratava-se de um processo obsessivo, asseverou: "Legião, sai dele". E rendendo à perfeição do Mestre os espíritos inferiores foram-se e deixaram aquele homem em paz.
Assim, "é a obsessão, cobrança que bate às portas da alma. É um processo bilateral. Faz-se presente porque existe de um lado o cobrador, sequioso de vingança, sentindo-se ferido e injustiçado, e de outro o devedor, trazendo impresso no seu perispírito as matizes de culpa, o remorso ou do ódio que não se extinguiu." (Suely Caldas Schubert, Obsessão / Desobsessão).
"As causas da obsessão variam, de acordo com o caráter do Espírito. E, às vezes, uma vingança que este toma de um indivíduo de quem guarda queixas da sua vida presente ou do tempo de outra existência. Muitas vezes, também, não há mais do que o desejo de fazer mal: o Espírito, como sofre, entende de fazer que os outros sofram; encontra uma espécie de gozo em os atormentar, em os vexar, e a impaciência que por isso a vítima demonstra mais o exacerba, porque esse é o objetivo que colima, ao passo que a paciência o leva a cansar-se. Com o irritar-se e mostrar-se despeitado, o perseguido faz exatamente o que quer o seu perseguidor. Esses Espíritos agem, não raro por ódio e inveja do bem; daí o lançarem suas vistas malfazejas sobre as pessoas mais honestas. Um deles se apegou como "tinha" a uma honrada família do nosso conhecimento, à qual, aliás, não teve a satisfação de enganar. Interrogado acerca do motivo por que se agarrara a pessoas distintas, em vez de o fazer a homens maus como ele, respondeu: estes não me causam inveja. Outros são guiados por um sentimento de covardia, que os induz a se aproveitarem da fraqueza moral de certos indivíduos, que eles sabem incapazes de lhes resistirem. Um destes últimos, que subjulgava um rapaz de inteligência muito apoucada, interrogado sobre os motivos dessa escolha, respondeu: Tenho grandíssima necessidade de atormentar alguém; uma pessoa criteriosa me repeliria; ligo-me a um idiota, que nenhuma força me opõe". (Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, capítulo XXIII).
Podemos ressaltar que as causas da obsessão são as seguintes:
.vingança de espíritos contra pessoas que lhes fizeram mal nesta reencarnação ou em outras reencarnações;
.Simples desejo de fazer os outros sofrerem, por ódio, inveja, covardia, pois o espírito inferior se compraz em fazer alguém infeliz.
.para usufruir dos mesmos condicionamentos que tinham quando na vida física, induzem os obsidiados a cometê-los (cigarro, drogas, sexo, etc)
.apegos às pessoas pelas quais tinham grandes paixões quando em vida;
.por interesses em destruir, desunir, dominar, provocar o mal, manter
distúrbios, partindo de espíritos inteligentes das hostes inferiores.
Allan Kardec salienta (A Gênese, pág. 305) que "Nos casos de obsessão grave, o obsidiado fica como que envolto e impregnado de um fluido pernicioso, que neutraliza a ação dos fluidos salutares e os repele..." Ainda nos orienta o Codificador (mesma obra, pág. 285), que "Sendo o perispírito dos encarnados de natureza idêntica à dos fluidos espirituais, ele os assimila com facilidade, como uma esponja se embebe de um líquido. Esses fluidos exercem sobre o perispírito uma ação tanto mais direta quando, por sua extensão e irradiação, o perispírito com eles se confunde. Atuando esses fluidos sobre o perispírito, este, a seu turno, reage sobre o organismo material com quem se acha em contato molecular. Se os eflúvios são de boa natureza, o corpo ressente uma impressão salutar; se são maus, a impressão é penosa. Se os eflúvios maus são permanentes e enérgicos, podem ocasionar desordens físicas; não é outra a causa de certas enfermidades". Daí a idéia de que "No conhecimento do perispírito está a chave de inúmeros problemas até hoje insolúveis". (Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, cap. I)
Posto isso, a obsessão é um fenômeno que causa sofrimento demasiado, estando, assim, na raiz de grande parte das depressões, angústias e transtornos psicológicos.
Para o tratamento da obsessão, o indivíduo deve procurar uma Casa Espírita a fim de fazer um tratamento de desobesesão com o intuito de que o espírito obsessor seja fraternalmente esclarecido e siga o seu caminho. Ressalta-se que tal procedimento é realizado por uma equipe devidamente habilitada constituída de doutrinadores, médiuns e sustentadores, para que o espírito adquira consciência e liberte-se da situação do modo mais tranqüilo possível. Quanto ao encarnado, assistir palestras espíritas, usufruir do passe, manter pensamentos edificantes, ter uma paisagem mental positiva perante a vida, estudar e entender a Vida Maior, ter uma palavra impecável, entregar-se à caridade em todos os momentos, fazer da vida uma oração constante, etc, são os meios de elevar a faixa vibratória e curar-se da obsessão. É a reforma íntima que cada um de nós deve promover em si, mantendo o pensamento elevado, com falas e atitudes corretas em todos os contextos. Tal problemática é do interesse de todos nós e, assim, lembremos da frase de Jesus: "Vigiai e Orai".
Indica-se, para não iniciantes na Doutrina Espírita, além das obras básicas, a leitura das obras de Joanna de Ângelis (Triunfo Pessoal e Elucidações Psicológicas à Luz do Espiritismo – psicografadas por Divaldo Franco) e Manoel Philomeno de Miranda (Nos Bastidores da Obsessão, Nas Fronteiras da Loucura, Loucura e Obsessão, Trilhas da Libertação, Painéis da Obsessão, Tormentos da Obsessão e, Sexo e obsessão – psicografados por Divaldo Franco). Para os iniciantes na Doutrina Espírita indica-se O Livro dos Espíritos (Allan Kardec), O Livro dos Médiuns (Allan Kardec), Desobsessão (André Luiz/Francisco Xavier) e Transtornos Mentais (Suely Caldas Schubert).
Assim, tal fenômeno existiu em todas as épocas da humanidade, de tal modo que, na época de Jesus, usava-se o termo possessão para denominar os fenômenos de cunho obsessivo. Recordemo-nos de quando Jesus caminhava e deparou com um homem mentalmente perturbado. O homem inquiriu o Mestre: "quem és tu?"
Jesus respondeu: "Eu sou Jesus, e tu meu irmão, quem és?"
O homem, totalmente desequilibrado, disse: "Tu não, nós...nós somos legião". Jesus, sabendo perfeitamente que tratava-se de um processo obsessivo, asseverou: "Legião, sai dele". E rendendo à perfeição do Mestre os espíritos inferiores foram-se e deixaram aquele homem em paz.
Assim, "é a obsessão, cobrança que bate às portas da alma. É um processo bilateral. Faz-se presente porque existe de um lado o cobrador, sequioso de vingança, sentindo-se ferido e injustiçado, e de outro o devedor, trazendo impresso no seu perispírito as matizes de culpa, o remorso ou do ódio que não se extinguiu." (Suely Caldas Schubert, Obsessão / Desobsessão).
"As causas da obsessão variam, de acordo com o caráter do Espírito. E, às vezes, uma vingança que este toma de um indivíduo de quem guarda queixas da sua vida presente ou do tempo de outra existência. Muitas vezes, também, não há mais do que o desejo de fazer mal: o Espírito, como sofre, entende de fazer que os outros sofram; encontra uma espécie de gozo em os atormentar, em os vexar, e a impaciência que por isso a vítima demonstra mais o exacerba, porque esse é o objetivo que colima, ao passo que a paciência o leva a cansar-se. Com o irritar-se e mostrar-se despeitado, o perseguido faz exatamente o que quer o seu perseguidor. Esses Espíritos agem, não raro por ódio e inveja do bem; daí o lançarem suas vistas malfazejas sobre as pessoas mais honestas. Um deles se apegou como "tinha" a uma honrada família do nosso conhecimento, à qual, aliás, não teve a satisfação de enganar. Interrogado acerca do motivo por que se agarrara a pessoas distintas, em vez de o fazer a homens maus como ele, respondeu: estes não me causam inveja. Outros são guiados por um sentimento de covardia, que os induz a se aproveitarem da fraqueza moral de certos indivíduos, que eles sabem incapazes de lhes resistirem. Um destes últimos, que subjulgava um rapaz de inteligência muito apoucada, interrogado sobre os motivos dessa escolha, respondeu: Tenho grandíssima necessidade de atormentar alguém; uma pessoa criteriosa me repeliria; ligo-me a um idiota, que nenhuma força me opõe". (Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, capítulo XXIII).
Podemos ressaltar que as causas da obsessão são as seguintes:
.vingança de espíritos contra pessoas que lhes fizeram mal nesta reencarnação ou em outras reencarnações;
.Simples desejo de fazer os outros sofrerem, por ódio, inveja, covardia, pois o espírito inferior se compraz em fazer alguém infeliz.
.para usufruir dos mesmos condicionamentos que tinham quando na vida física, induzem os obsidiados a cometê-los (cigarro, drogas, sexo, etc)
.apegos às pessoas pelas quais tinham grandes paixões quando em vida;
.por interesses em destruir, desunir, dominar, provocar o mal, manter
distúrbios, partindo de espíritos inteligentes das hostes inferiores.
Allan Kardec salienta (A Gênese, pág. 305) que "Nos casos de obsessão grave, o obsidiado fica como que envolto e impregnado de um fluido pernicioso, que neutraliza a ação dos fluidos salutares e os repele..." Ainda nos orienta o Codificador (mesma obra, pág. 285), que "Sendo o perispírito dos encarnados de natureza idêntica à dos fluidos espirituais, ele os assimila com facilidade, como uma esponja se embebe de um líquido. Esses fluidos exercem sobre o perispírito uma ação tanto mais direta quando, por sua extensão e irradiação, o perispírito com eles se confunde. Atuando esses fluidos sobre o perispírito, este, a seu turno, reage sobre o organismo material com quem se acha em contato molecular. Se os eflúvios são de boa natureza, o corpo ressente uma impressão salutar; se são maus, a impressão é penosa. Se os eflúvios maus são permanentes e enérgicos, podem ocasionar desordens físicas; não é outra a causa de certas enfermidades". Daí a idéia de que "No conhecimento do perispírito está a chave de inúmeros problemas até hoje insolúveis". (Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, cap. I)
Posto isso, a obsessão é um fenômeno que causa sofrimento demasiado, estando, assim, na raiz de grande parte das depressões, angústias e transtornos psicológicos.
Para o tratamento da obsessão, o indivíduo deve procurar uma Casa Espírita a fim de fazer um tratamento de desobesesão com o intuito de que o espírito obsessor seja fraternalmente esclarecido e siga o seu caminho. Ressalta-se que tal procedimento é realizado por uma equipe devidamente habilitada constituída de doutrinadores, médiuns e sustentadores, para que o espírito adquira consciência e liberte-se da situação do modo mais tranqüilo possível. Quanto ao encarnado, assistir palestras espíritas, usufruir do passe, manter pensamentos edificantes, ter uma paisagem mental positiva perante a vida, estudar e entender a Vida Maior, ter uma palavra impecável, entregar-se à caridade em todos os momentos, fazer da vida uma oração constante, etc, são os meios de elevar a faixa vibratória e curar-se da obsessão. É a reforma íntima que cada um de nós deve promover em si, mantendo o pensamento elevado, com falas e atitudes corretas em todos os contextos. Tal problemática é do interesse de todos nós e, assim, lembremos da frase de Jesus: "Vigiai e Orai".
Indica-se, para não iniciantes na Doutrina Espírita, além das obras básicas, a leitura das obras de Joanna de Ângelis (Triunfo Pessoal e Elucidações Psicológicas à Luz do Espiritismo – psicografadas por Divaldo Franco) e Manoel Philomeno de Miranda (Nos Bastidores da Obsessão, Nas Fronteiras da Loucura, Loucura e Obsessão, Trilhas da Libertação, Painéis da Obsessão, Tormentos da Obsessão e, Sexo e obsessão – psicografados por Divaldo Franco). Para os iniciantes na Doutrina Espírita indica-se O Livro dos Espíritos (Allan Kardec), O Livro dos Médiuns (Allan Kardec), Desobsessão (André Luiz/Francisco Xavier) e Transtornos Mentais (Suely Caldas Schubert).
Tipos de mediunidade
“Todo aquele que sente, num grau qualquer, a influência
dos Espíritos é, por esse fato, médium.
Essa faculdade é inerente ao homem; não constitui,
portanto, um privilégio exclusivo. (...) Pode, pois,
dizer-se que todos são, mais ou menos, médiuns.
(Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, capítulo XIV).
Assim, conforme asseverou o Codificador, todos mantemos contato com o Mundo Espiritual, pois vivemos em incessante intercâmbio com o mesmo. Desta forma, ao fazermos uma oração recebemos o amparo da espiritualidade maior, do nosso protetor/mentor espiritual, entramos em contato com as usinas de força da Vida Maior. Por conseguinte, estamos exercendo a mediunidade, haja vista que recebemos a influência dos espíritos superiores. E, pela questão da sintonia vibratória, isso também vale para os espíritos menos elevados, pois quando alguém tem pensamentos inferiores, espíritos que se afinam com estes são atraídos. "O pensamento é o laço que nos une aos Espíritos, e pelo pensamento nós atraímos os que simpatizam com as nossas idéias e inclinações". Allan Kardec. Entretanto, usualmente só se chamam de médiuns “aqueles em quem a faculdade mediúnica se mostra bem caracterizada e se traduz por efeitos patentes, de certa intensidade, o que então depende de uma organização mais ou menos sensitiva”. (Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, capítulo IX)
Posto isso, os principais tipos de mediunidade são:
.de efeitos físicos: este tipo pode ser dividido em dois grupos, ou seja, os facultativos - que têm consciência dos fenômenos por eles produzidos - e os involuntários ou naturais, que são inconscientes de suas faculdades, mas são usados pelos espíritos para promoverem manifestações fenomênicas sem que o saibam.
.dos médiuns sensitivos ou impressionáveis: são pessoas suscetíveis de sentirem a presença dos espíritos por uma vaga impressão. Esta faculdade se desenvolve pelo hábito e pode adquirir tal sutileza, que aquele que a possui reconhece, pela impressão que experimenta, não só a natureza, boa ou má, do espírito que se aproxima, mas até a sua individualidade.
.médiuns audientes ou clariaudientes: neste caso os médiuns ouvem a voz dos espíritos. O fenômeno manifesta-se algumas vezes como uma voz interior, que se faz ouvir no foro íntimo. Outras vezes, dá-se como uma voz exterior, clara e distinta, semelhante a de uma pessoa viva. Os médiuns audientes podem, assim, estabelecer conversação com os espíritos.
.médiuns videntes ou clarividentes: são dotados da faculdade de ver os espíritos. Cabe salientar que o médium não vê com os olhos, mas é a alma quem vê e por isso é que eles tanto vêem com os olhos fechados, como com os olhos abertos.
.médiuns psicofônicos: neste tipo o médium serve como um instrumento pelo qual o espírito se comunica pela fala; assim, há a acoplação do perispírito do espírito comunicante no perispírito do médium, permitindo, assim, que o espírito utilize o aparelho fonador do médium para fazer uso da fala.
.médiuns de cura: Este gênero de mediunidade consiste, principalmente, no dom que possuem certas pessoas de curar pelo simples toque, pelo olhar, mesmo por um gesto, sem o concurso de qualquer medicação. Dir-se-á, sem dúvida, que isso mais não é do que magnetismo. Evidentemente, o fluido magnético desempenha aí importante papel. Porém, quem examina cuidadosamente o fenômeno sem dificuldade reconhece que há mais alguma coisa. A magnetização ordinária é um verdadeiro tratamento seguido, regular e metódico. No caso que apreciamos, as coisas se passam de modo inteiramente diverso. Todos os magnetizadores são mais ou menos aptos a curar, desde que saibam conduzir-se convenientemente, ao passo que nos médiuns curadores a faculdade é espontânea e alguns até a possuem sem jamais terem ouvido falar de magnetismo. A intervenção de uma potência oculta, que é o que constitui a mediunidade, se faz manifesta, em certas circunstâncias, sobretudo se considerarmos que a maioria das pessoas que podem, com razão, ser qualificadas de médiuns curadores recorre à prece, que é uma verdadeira evocação.
.médiuns mecânicos: Quem examinar certos efeitos que se produzem nos movimentos da mesa, da cesta, ou da prancheta que escreve não poderá duvidar de uma ação diretamente exercida pelo Espírito sobre esses objetos. A cesta se agita por vezes com tanta violência, que escapa das mãos do médium e não raro se dirige a certas pessoas da assistência para nelas bater. Outras vezes, seus movimentos dão mostra de um sentimento afetuoso. O mesmo ocorre quando o lápis está colocado na mão do médium; freqüentemente é atirado longe com força, ou, então, a mão, bem como a cesta, se agitam convulsivamente e batem na mesa de modo colérico, ainda quando o médium está possuído da maior calma e se admira de não ser senhor de si Digamos, de passagem, que tais efeitos demonstram sempre a presença de Espíritos imperfeitos; os Espíritos superiores são constantemente calmos, dignos e benévolos; se não são escutados convenientemente, retiram-se e outros lhes tomam o lugar. Pode, pois, o Espírito exprimir diretamente suas idéias, quer movimentando um objeto a que a mão do médium serve de simples ponto de apoio, quer acionando a própria mão.
Quando atua diretamente sobre a mão, o Espírito lhe dá uma impulsão de todo independente da vontade deste último. Ela se move sem interrupção e sem embargo do médium, enquanto o Espírito tem alguma coisa que dizer, e pára, assim ele acaba.
Nesta circunstância, o que caracteriza o fenômeno é que o médium não tem a menor consciência do que escreve. Quando se dá, no caso, a inconsciência absoluta; têm-se os médiuns chamados passivos ou mecânicos. E preciosa esta faculdade, por não permitir dúvida alguma sobre a independência do pensamento daquele que escreve.
.médiuns intuitivos: 180. A transmissão do pensamento também se dá por meio do Espírito do médium, ou, melhor, de sua alma, pois que por este nome designamos o Espírito encarnado. O Espírito livre, neste caso, não atua sobre a mão, para fazê-la escrever; não a toma, não a guia. Atua sobre a alma, com a qual se identifica. A alma, sob esse impulso, dirige a mão e esta dirige o lápis. Notemos aqui uma coisa importante: é que o Espírito livre não se substitui à alma, visto que não a pode deslocar. Domina-a, mau grado seu, e lhe imprime a sua vontade. Em tal circunstância, o papel da alma não é o de inteira passividade; ela recebe o pensamento do Espírito livre e o transmite. Nessa situação, o médium tem consciência do que escreve, embora não exprima o seu próprio pensamento. E o que se chama médium intuitivo.
Mas, sendo assim, dir-se-á, nada prova seja um Espírito estranho quem escreve e não o do médium. Efetivamente, a distinção é às vezes difícil de fazer-se, porém, pode acontecer que isso pouca importância apresente. Todavia, é possível reconhecer-se o pensamento sugerido, por não ser nunca preconcebido; nasce à medida que a escrita vai sendo traçada e, amiúde, é contrário à idéia que antecipadamente se formara. Pode mesmo estar fora dos limites dos conhecimentos e capacidades do médium.
O papel do médium mecânico é o de uma máquina; o médium intuitivo age como o faria um intérprete. Este, de fato, para transmitir o pensamento, precisa compreendê-lo, apropriar-se dele, de certo modo, para traduzi-lo fielmente e, no entanto, esse pensamento não é seu, apenas lhe atravessa o cérebro. Tal precisamente o papel do médium intuitivo.
.médiuns semimecânicos: 181. No médium puramente mecânico, o movimento da mão independe da vontade; no médium intuitivo, o movimento é voluntário e facultativo. O médium semimecânico participa de ambos esses gêneros. Sente que à sua mão uma impulsão é dada, mau grado seu, mas, ao mesmo tempo, tem consciência do que escreve, à medida que as palavras se formam. No primeiro o pensamento vem depois do ato da escrita; no segundo, precede-o; no terceiro, acompanha-o. Estes últimos médiuns são os mais numerosos
.médiuns inspirados: 182. Todo aquele que, tanto no estado normal, como no de êxtase, recebe, pelo pensamento, comunicações estranhas às suas idéias preconcebidas, pode ser incluído na categoria dos médiuns inspirados. Estes, como se vê, formam uma variedade da mediunidade intuitiva, com a diferença de que a intervenção de uma força oculta é aí muito menos sensível, por isso que, ao inspirado, ainda é mais difícil distinguir o pensamento próprio do que lhe é sugerido. A espontaneidade é o que, sobretudo, caracteriza o pensamento deste último gênero. A inspiração nos vem dos Espíritos que nos influenciam para o bem, ou para o mal, porém, procede, principalmente, dos que querem o nosso bem e cujos conselhos muito amiúde cometemos o erro de não seguir. Ela se aplica, em todas as circunstâncias da vida, às resoluções que devamos tomar. Sob esse aspecto, pode dizer-se que todos são médiuns, porquanto não há quem não tenha seus Espíritos protetores e familiares, a se esforçarem por sugerir aos protegidos salutares idéias. Se todos estivessem bem compenetrados desta verdade, ninguém deixaria de recorrer com freqüência à inspiração do seu anjo de guarda, nos momentos em que se não sabe o que dizer, ou fazer. Que cada um, pois, o invoque com fervor e confiança, em caso de necessidade, e muito freqüentemente se admirará das idéias que lhe surgem como por encanto, quer se trate de uma resolução a tomar, quer de alguma coisa a compor. Se nenhuma idéia surge, é que é preciso esperar. A prova de que a idéia que sobrevém é estranha à pessoa de quem se trate esta em que, se tal idéia lhe existira na mente, essa pessoa seria senhora de, a qualquer momento, utilizá-la e não haveria razão para que ela se não manifestasse à vontade. Quem não é cego nada mais precisa fazer do que abrir os olhos, para ver quando quiser. Do mesmo modo, aquele que possui idéias próprias tem-nas sempre à disposição. Se elas não lhes vêm quando quer, é que está obrigado a buscá-las algures, que não no seu intimo.
Também se podem incluir nesta categoria as pessoas que, sem serem dotadas de inteligência fora do comum e sem saírem do estado normal, têm relâmpagos de uma lucidez intelectual que lhes dá momentaneamente desabitual facilidade de concepção e de elocução e, em certos casos, o pressentimento de coisas futuras. Nesses momentos, que com acerto se chamam de inspiração, as idéias abundam, sob um impulso involuntário e quase febril. Parece que uma inteligência superior nos vem ajudar e que o nosso espírito se desembaraçou de um fardo.
183. Os homens de gênio, de todas as espécies, artistas, sábios, literatos, são sem dúvida Espíritos adiantados, capazes de compreender por si mesmos e de conceber grandes coisas. Ora, precisamente porque os julgam capazes, é que os Espíritos, quando querem executar certos trabalhos, lhes sugerem as idéias necessárias e assim é que eles, as mais das vezes, são médiuns sem o saberem. Têm, no entanto, vaga intuição de uma assistência estranha, visto que todo aquele que apela para a inspiração, mais não faz do que uma evocação. Se não esperasse ser atendido, por que exclamaria, tão freqüentemente: meu bom gênio, vem em meu auxílio?
As respostas seguintes confirmam esta asserção:
a) Qual a causa primária da inspiração?
"O Espírito que se comunica pelo pensamento."
b) A revelação das grandes coisas não é que constitui o objeto único da inspiração?
"Não, a inspiração se verifica, muitas vezes, com relação às mais comuns circunstâncias da vida. Por exemplo, queres ir a alguma parte: uma voz secreta te diz que não o faças, porque correrás perigo; ou, então, te diz que faças uma coisa em que não pensavas. É a inspiração. Poucas pessoas há que não tenham sido mais ou menos inspiradas em certos momentos."
c) Um autor, um pintor, por exemplo, poderiam, nos momentos de inspiração, ser considerados médiuns?
"Sim, porquanto, nesses momentos, a alma se lhes torna mais livre e como que desprendida da matéria; recobra uma parte das suas faculdades de Espírito e recebe mais facilmente as comunicações dos outros Espíritos que a inspiram."
.médiuns de pressentimentos: O pressentimento é uma intuição vaga das coisas futuras. Algumas pessoas têm essa faculdade mais ou menos desenvolvida. Pode ser devida a uma espécie de dupla vista, que lhes permite entrever as conseqüências das coisas atuais e a filiação dos acontecimentos. Mas, muitas vezes, também é resultado de comunicações ocultas e, sobretudo neste caso, é que se pode dar aos que dela são dotados o nome de médiuns de pressentimentos, que constituem uma variedade dos médiuns inspirados.
"Mediunidade espírita, porém, é a que faculta o intercâmbio consciente, responsável, entre o mundo físico e o espiritual, facultando a sublimação das provas pela superação da dor e pela renúncia às paixões, ao mesmo tempo abrindo à criatura os horizontes luminosos para a libertação total, mediante o serviço aos companheiros do caminho humano, gerando amor com os instrumentos da caridade redentora de que ninguém pode prescindir". Joanna de Ângelis (espírito), livro Oferenda - pág. 130/131 -, psicografado por Divaldo Franco
.médiuns psicógrafos: Transmitem as comunicações dos espíritos através da escrita. São subdivididos em mecânicos, semimecânicos e intuitivos. Os mecânicos não têm consciência do que escrevem e a influência do pensamento do médium na comunicação é quase nenhuma. Como há um grande domínio da entidade sobre a faculdade mediúnica a idéia do espírito comunicante se expressa com maior clareza. Há casos em que o médium psicografa mensagens complexas conversando com outras pessoas, totalmente distraído do que escreve. Já nos semimecânicos, a influência da entidade comunicante sobre as faculdades mediúnicas não é tão intensa, pois a comunicação sofre uma influência do pensamento do médium. Isso ocorre com a maioria dos médiuns psicógrafos. Com relação os intuitivos, estes recebem a idéia do espírito comunicante e a interpretam, desenvolvendo-a com os recursos de suas próprias possibilidades morais e intelectuais.
“Mediunidade espírita, porém, é a que faculta o intercâmbio consciente, responsável, entre o mundo físico e o espiritual, facultando a sublimação das provas pela superação da dor e pela renúncia às paixões, ao mesmo tempo abrindo à criatura os horizontes luminosos para a libertação total, mediante o serviço aos companheiros do caminho humano, gerando amor com os instrumentos da caridade redentora de que ninguém pode prescindir”. Joanna de Ângelis (espírito), livro Oferenda – pág. 130/131 -, psicografado por Divaldo Franco
Assim, conforme asseverou o Codificador, todos mantemos contato com o Mundo Espiritual, pois vivemos em incessante intercâmbio com o mesmo. Desta forma, ao fazermos uma oração recebemos o amparo da espiritualidade maior, do nosso protetor/mentor espiritual, entramos em contato com as usinas de força da Vida Maior. Por conseguinte, estamos exercendo a mediunidade, haja vista que recebemos a influência dos espíritos superiores. E, pela questão da sintonia vibratória, isso também vale para os espíritos menos elevados, pois quando alguém tem pensamentos inferiores, espíritos que se afinam com estes são atraídos. "O pensamento é o laço que nos une aos Espíritos, e pelo pensamento nós atraímos os que simpatizam com as nossas idéias e inclinações". Allan Kardec. Entretanto, usualmente só se chamam de médiuns “aqueles em quem a faculdade mediúnica se mostra bem caracterizada e se traduz por efeitos patentes, de certa intensidade, o que então depende de uma organização mais ou menos sensitiva”. (Allan Kardec, O Livro dos Médiuns, capítulo IX)
Posto isso, os principais tipos de mediunidade são:
.de efeitos físicos: este tipo pode ser dividido em dois grupos, ou seja, os facultativos - que têm consciência dos fenômenos por eles produzidos - e os involuntários ou naturais, que são inconscientes de suas faculdades, mas são usados pelos espíritos para promoverem manifestações fenomênicas sem que o saibam.
.dos médiuns sensitivos ou impressionáveis: são pessoas suscetíveis de sentirem a presença dos espíritos por uma vaga impressão. Esta faculdade se desenvolve pelo hábito e pode adquirir tal sutileza, que aquele que a possui reconhece, pela impressão que experimenta, não só a natureza, boa ou má, do espírito que se aproxima, mas até a sua individualidade.
.médiuns audientes ou clariaudientes: neste caso os médiuns ouvem a voz dos espíritos. O fenômeno manifesta-se algumas vezes como uma voz interior, que se faz ouvir no foro íntimo. Outras vezes, dá-se como uma voz exterior, clara e distinta, semelhante a de uma pessoa viva. Os médiuns audientes podem, assim, estabelecer conversação com os espíritos.
.médiuns videntes ou clarividentes: são dotados da faculdade de ver os espíritos. Cabe salientar que o médium não vê com os olhos, mas é a alma quem vê e por isso é que eles tanto vêem com os olhos fechados, como com os olhos abertos.
.médiuns psicofônicos: neste tipo o médium serve como um instrumento pelo qual o espírito se comunica pela fala; assim, há a acoplação do perispírito do espírito comunicante no perispírito do médium, permitindo, assim, que o espírito utilize o aparelho fonador do médium para fazer uso da fala.
.médiuns de cura: Este gênero de mediunidade consiste, principalmente, no dom que possuem certas pessoas de curar pelo simples toque, pelo olhar, mesmo por um gesto, sem o concurso de qualquer medicação. Dir-se-á, sem dúvida, que isso mais não é do que magnetismo. Evidentemente, o fluido magnético desempenha aí importante papel. Porém, quem examina cuidadosamente o fenômeno sem dificuldade reconhece que há mais alguma coisa. A magnetização ordinária é um verdadeiro tratamento seguido, regular e metódico. No caso que apreciamos, as coisas se passam de modo inteiramente diverso. Todos os magnetizadores são mais ou menos aptos a curar, desde que saibam conduzir-se convenientemente, ao passo que nos médiuns curadores a faculdade é espontânea e alguns até a possuem sem jamais terem ouvido falar de magnetismo. A intervenção de uma potência oculta, que é o que constitui a mediunidade, se faz manifesta, em certas circunstâncias, sobretudo se considerarmos que a maioria das pessoas que podem, com razão, ser qualificadas de médiuns curadores recorre à prece, que é uma verdadeira evocação.
.médiuns mecânicos: Quem examinar certos efeitos que se produzem nos movimentos da mesa, da cesta, ou da prancheta que escreve não poderá duvidar de uma ação diretamente exercida pelo Espírito sobre esses objetos. A cesta se agita por vezes com tanta violência, que escapa das mãos do médium e não raro se dirige a certas pessoas da assistência para nelas bater. Outras vezes, seus movimentos dão mostra de um sentimento afetuoso. O mesmo ocorre quando o lápis está colocado na mão do médium; freqüentemente é atirado longe com força, ou, então, a mão, bem como a cesta, se agitam convulsivamente e batem na mesa de modo colérico, ainda quando o médium está possuído da maior calma e se admira de não ser senhor de si Digamos, de passagem, que tais efeitos demonstram sempre a presença de Espíritos imperfeitos; os Espíritos superiores são constantemente calmos, dignos e benévolos; se não são escutados convenientemente, retiram-se e outros lhes tomam o lugar. Pode, pois, o Espírito exprimir diretamente suas idéias, quer movimentando um objeto a que a mão do médium serve de simples ponto de apoio, quer acionando a própria mão.
Quando atua diretamente sobre a mão, o Espírito lhe dá uma impulsão de todo independente da vontade deste último. Ela se move sem interrupção e sem embargo do médium, enquanto o Espírito tem alguma coisa que dizer, e pára, assim ele acaba.
Nesta circunstância, o que caracteriza o fenômeno é que o médium não tem a menor consciência do que escreve. Quando se dá, no caso, a inconsciência absoluta; têm-se os médiuns chamados passivos ou mecânicos. E preciosa esta faculdade, por não permitir dúvida alguma sobre a independência do pensamento daquele que escreve.
.médiuns intuitivos: 180. A transmissão do pensamento também se dá por meio do Espírito do médium, ou, melhor, de sua alma, pois que por este nome designamos o Espírito encarnado. O Espírito livre, neste caso, não atua sobre a mão, para fazê-la escrever; não a toma, não a guia. Atua sobre a alma, com a qual se identifica. A alma, sob esse impulso, dirige a mão e esta dirige o lápis. Notemos aqui uma coisa importante: é que o Espírito livre não se substitui à alma, visto que não a pode deslocar. Domina-a, mau grado seu, e lhe imprime a sua vontade. Em tal circunstância, o papel da alma não é o de inteira passividade; ela recebe o pensamento do Espírito livre e o transmite. Nessa situação, o médium tem consciência do que escreve, embora não exprima o seu próprio pensamento. E o que se chama médium intuitivo.
Mas, sendo assim, dir-se-á, nada prova seja um Espírito estranho quem escreve e não o do médium. Efetivamente, a distinção é às vezes difícil de fazer-se, porém, pode acontecer que isso pouca importância apresente. Todavia, é possível reconhecer-se o pensamento sugerido, por não ser nunca preconcebido; nasce à medida que a escrita vai sendo traçada e, amiúde, é contrário à idéia que antecipadamente se formara. Pode mesmo estar fora dos limites dos conhecimentos e capacidades do médium.
O papel do médium mecânico é o de uma máquina; o médium intuitivo age como o faria um intérprete. Este, de fato, para transmitir o pensamento, precisa compreendê-lo, apropriar-se dele, de certo modo, para traduzi-lo fielmente e, no entanto, esse pensamento não é seu, apenas lhe atravessa o cérebro. Tal precisamente o papel do médium intuitivo.
.médiuns semimecânicos: 181. No médium puramente mecânico, o movimento da mão independe da vontade; no médium intuitivo, o movimento é voluntário e facultativo. O médium semimecânico participa de ambos esses gêneros. Sente que à sua mão uma impulsão é dada, mau grado seu, mas, ao mesmo tempo, tem consciência do que escreve, à medida que as palavras se formam. No primeiro o pensamento vem depois do ato da escrita; no segundo, precede-o; no terceiro, acompanha-o. Estes últimos médiuns são os mais numerosos
.médiuns inspirados: 182. Todo aquele que, tanto no estado normal, como no de êxtase, recebe, pelo pensamento, comunicações estranhas às suas idéias preconcebidas, pode ser incluído na categoria dos médiuns inspirados. Estes, como se vê, formam uma variedade da mediunidade intuitiva, com a diferença de que a intervenção de uma força oculta é aí muito menos sensível, por isso que, ao inspirado, ainda é mais difícil distinguir o pensamento próprio do que lhe é sugerido. A espontaneidade é o que, sobretudo, caracteriza o pensamento deste último gênero. A inspiração nos vem dos Espíritos que nos influenciam para o bem, ou para o mal, porém, procede, principalmente, dos que querem o nosso bem e cujos conselhos muito amiúde cometemos o erro de não seguir. Ela se aplica, em todas as circunstâncias da vida, às resoluções que devamos tomar. Sob esse aspecto, pode dizer-se que todos são médiuns, porquanto não há quem não tenha seus Espíritos protetores e familiares, a se esforçarem por sugerir aos protegidos salutares idéias. Se todos estivessem bem compenetrados desta verdade, ninguém deixaria de recorrer com freqüência à inspiração do seu anjo de guarda, nos momentos em que se não sabe o que dizer, ou fazer. Que cada um, pois, o invoque com fervor e confiança, em caso de necessidade, e muito freqüentemente se admirará das idéias que lhe surgem como por encanto, quer se trate de uma resolução a tomar, quer de alguma coisa a compor. Se nenhuma idéia surge, é que é preciso esperar. A prova de que a idéia que sobrevém é estranha à pessoa de quem se trate esta em que, se tal idéia lhe existira na mente, essa pessoa seria senhora de, a qualquer momento, utilizá-la e não haveria razão para que ela se não manifestasse à vontade. Quem não é cego nada mais precisa fazer do que abrir os olhos, para ver quando quiser. Do mesmo modo, aquele que possui idéias próprias tem-nas sempre à disposição. Se elas não lhes vêm quando quer, é que está obrigado a buscá-las algures, que não no seu intimo.
Também se podem incluir nesta categoria as pessoas que, sem serem dotadas de inteligência fora do comum e sem saírem do estado normal, têm relâmpagos de uma lucidez intelectual que lhes dá momentaneamente desabitual facilidade de concepção e de elocução e, em certos casos, o pressentimento de coisas futuras. Nesses momentos, que com acerto se chamam de inspiração, as idéias abundam, sob um impulso involuntário e quase febril. Parece que uma inteligência superior nos vem ajudar e que o nosso espírito se desembaraçou de um fardo.
183. Os homens de gênio, de todas as espécies, artistas, sábios, literatos, são sem dúvida Espíritos adiantados, capazes de compreender por si mesmos e de conceber grandes coisas. Ora, precisamente porque os julgam capazes, é que os Espíritos, quando querem executar certos trabalhos, lhes sugerem as idéias necessárias e assim é que eles, as mais das vezes, são médiuns sem o saberem. Têm, no entanto, vaga intuição de uma assistência estranha, visto que todo aquele que apela para a inspiração, mais não faz do que uma evocação. Se não esperasse ser atendido, por que exclamaria, tão freqüentemente: meu bom gênio, vem em meu auxílio?
As respostas seguintes confirmam esta asserção:
a) Qual a causa primária da inspiração?
"O Espírito que se comunica pelo pensamento."
b) A revelação das grandes coisas não é que constitui o objeto único da inspiração?
"Não, a inspiração se verifica, muitas vezes, com relação às mais comuns circunstâncias da vida. Por exemplo, queres ir a alguma parte: uma voz secreta te diz que não o faças, porque correrás perigo; ou, então, te diz que faças uma coisa em que não pensavas. É a inspiração. Poucas pessoas há que não tenham sido mais ou menos inspiradas em certos momentos."
c) Um autor, um pintor, por exemplo, poderiam, nos momentos de inspiração, ser considerados médiuns?
"Sim, porquanto, nesses momentos, a alma se lhes torna mais livre e como que desprendida da matéria; recobra uma parte das suas faculdades de Espírito e recebe mais facilmente as comunicações dos outros Espíritos que a inspiram."
.médiuns de pressentimentos: O pressentimento é uma intuição vaga das coisas futuras. Algumas pessoas têm essa faculdade mais ou menos desenvolvida. Pode ser devida a uma espécie de dupla vista, que lhes permite entrever as conseqüências das coisas atuais e a filiação dos acontecimentos. Mas, muitas vezes, também é resultado de comunicações ocultas e, sobretudo neste caso, é que se pode dar aos que dela são dotados o nome de médiuns de pressentimentos, que constituem uma variedade dos médiuns inspirados.
"Mediunidade espírita, porém, é a que faculta o intercâmbio consciente, responsável, entre o mundo físico e o espiritual, facultando a sublimação das provas pela superação da dor e pela renúncia às paixões, ao mesmo tempo abrindo à criatura os horizontes luminosos para a libertação total, mediante o serviço aos companheiros do caminho humano, gerando amor com os instrumentos da caridade redentora de que ninguém pode prescindir". Joanna de Ângelis (espírito), livro Oferenda - pág. 130/131 -, psicografado por Divaldo Franco
.médiuns psicógrafos: Transmitem as comunicações dos espíritos através da escrita. São subdivididos em mecânicos, semimecânicos e intuitivos. Os mecânicos não têm consciência do que escrevem e a influência do pensamento do médium na comunicação é quase nenhuma. Como há um grande domínio da entidade sobre a faculdade mediúnica a idéia do espírito comunicante se expressa com maior clareza. Há casos em que o médium psicografa mensagens complexas conversando com outras pessoas, totalmente distraído do que escreve. Já nos semimecânicos, a influência da entidade comunicante sobre as faculdades mediúnicas não é tão intensa, pois a comunicação sofre uma influência do pensamento do médium. Isso ocorre com a maioria dos médiuns psicógrafos. Com relação os intuitivos, estes recebem a idéia do espírito comunicante e a interpretam, desenvolvendo-a com os recursos de suas próprias possibilidades morais e intelectuais.
“Mediunidade espírita, porém, é a que faculta o intercâmbio consciente, responsável, entre o mundo físico e o espiritual, facultando a sublimação das provas pela superação da dor e pela renúncia às paixões, ao mesmo tempo abrindo à criatura os horizontes luminosos para a libertação total, mediante o serviço aos companheiros do caminho humano, gerando amor com os instrumentos da caridade redentora de que ninguém pode prescindir”. Joanna de Ângelis (espírito), livro Oferenda – pág. 130/131 -, psicografado por Divaldo Franco
Espiritismo e espiritualismo
Espiritismo e espiritualismo
Pergunta de um Visitante a Allan Kardec
– Pergunto-vos, em primeiro lugar, qual a necessidade da criação de novos termos espírita e espiritualismo para substituir : espiritualista e espiritualismo
, que são da língua vulgar e por todos compreendidos?
Já ouvi alguém classificar tais termos de
barbarismos
.
Allan Kardec responde
— De há muito tem já a palavra
espiritualista
uma acepção
bem determinada; é a Academia que no-la dá:
Espiritualista, aquele ou
aquela pessoa cuja doutrina é oposta ao materialismo
.
Todas as religiões são necessariamente fundadas sobre o espiritua-
lismo. Aquele que crê que em nós existe outra coisa, além da matéria,
é espiritualista, o que não implica a crença nos Espíritos e nas suas ma-
nifestações. Como o podereis distinguir daquele que tem esta crença?
Ver-vos-eis obrigado a servir-vos de uma perífrase e dizer: É um espiri-
tualista que crê ou não crê nos Espíritos.
Para as novas coisas são necessários termos novos, quando se quer
evitar equívocos. Se eu tivesse dado à minha Revista a qualificação de espiritualista, não lhe teria especificado o objeto, porque, sem desmentir-lhe o
título, bem poderia nada dizer nela sobre os Espíritos, e até combatê-los.
Já há algum tempo, li num jornal, a propósito de uma obra filo-
sófica, um artigo em que se dizia tê-la o autor escrito do ponto de vista
espiritualista; ora, os partidários dos Espíritos ficariam singularmente de-
sapontados se, confiantes nessa indicação, acreditassem encontrar alguma
concordância entre o que ela ensina e as ideias por eles admitidas.
Se adotei os termos
espírita, espiritismo é porque eles exprimem, sem equívoco, as ideias relativas aos Espíritos.
O que é o Espiritismo?
O Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma
doutrina filosófica. Como ciência prática ele consiste nas relações que se estabe-
lecem entre nós e os espíritos; como filosofia, compreende todas as consequências morais que dimanam dessas mesmas relações,
O Espiritismo é uma ciência que trata da natureza, origem e destino dos
Espíritos, bem como de suas relações com o mundo corporal.BIOGRAFIA DE ALLAN KARDEC
BIOGRAFIA DE ALLAN KARDEC 1
Minhas senhoras, meus senhores:
Muitas pessoas que se interessam pelo Espiritismo manifestam mui-
tas vezes o pesar de não possuírem senão muito imperfeito conhecimen-
to da biografia de Allan Kardec, e de não saberem onde encontrar, sobre
aquele a quem chamamos mestre, as informações que desejariam conhecer.
Pois é para honrar Allan Kardec e festejar a sua memória que nos achamos
hoje reunidos, e um mesmo sentimento de veneração e de reconhecimento
faz vibrar todos os corações. Em respeito ao fundador da filosofia espírita,
permiti-me, no intuito de tentar corresponder a tão legítimo desejo, que
vos entretenha alguns momentos com esse mestre amado, cujos trabalhos
são universalmente conhecidos e apreciados, e cuja vida íntima e laboriosa
existência são apenas conjeturadas.
Se fácil foi a todos os investigadores conscienciosos inteirarem-se do
alto valor e do grande alcance da obra de Allan Kardec pela leitura atenta das
suas produções, bem poucos puderam, pela ausência até hoje de elementos
para isso, penetrar na vida do homem íntimo e segui-lo passo a passo no
desempenho da sua tarefa, tão grande, tão gloriosa e tão bem preenchida.
Não somente a biografia de Allan Kardec é pouco conhecida, senão
que ainda está por ser escrita. A inveja e o ciúme semearam sobre ela os
mais evidentes erros, as mais grosseiras e as mais impudentes calúnias.
Vou, portanto, esforçar-me por mostrar-vos, com luz mais verdadei-
ra, o grande iniciador de quem nos desvanecemos de ser discípulos.
Todos sabeis que a nossa cidade se pode honrar, a justo título, de ter
visto nascer entre seus muros esse pensador tão arrojado quão
metódico,
1
N.E.: Seu verdadeiro nome é
Hippolyte-Léon-Denizard Rivail,
conforme estudo de autoria de Zêus
Wantuil, inserto em
Reformador
de abril de 1963, p. 95 e 96, intitulado
Kardec e seu nome civil.
Esse filósofo sábio, clarividente e profundo, esse trabalhador obstinado
cujo labor sacudiu o edifício religioso do Velho Mundo e preparou os no-
vos fundamentos que deveriam servir de base à evolução e à renovação da
nossa sociedade caduca, impelindo-a para um ideal mais são, mais elevado,
para um adiantamento intelectual e moral seguros.
Foi, com efeito, em Lyon, que, a 3 de outubro de 1804, nasceu de
antiga família lionesa, com o nome de Rivail, aquele que devia mais tarde
ilustrar o nome de Allan Kardec e conquistar para ele tantos títulos à nossa
profunda simpatia, ao nosso filial reconhecimento.
Eis aqui a esse respeito um documento positivo e oficial:
“Aos 12 do vindemiário 2 do ano XIII, auto do nascimento de
Denizard Hippolyte-Léon Rivail, nascido ontem às 7 horas da noite, filho
de Jean-Baptiste Antoine Rivail, magistrado, juiz, e Jeanne Duhamel, sua
esposa, residentes em Lyon, rua Sala, número 76,
O sexo da criança foi reconhecido como masculino.
Testemunhas maiores:
Syriaque-Frédéric Dittmar, diretor do estabelecimento das águas mi-
nerais da rua Sala, e Jean-François Targe, mesma rua Sala, à requisição do
médico Pierre Radamel, rua Saint-Dominique, n 78.
Feita a leitura, as testemunhas assinaram, assim como o Maire da região do Sul.
O presidente do Tribunal.”
(assinado):Mathiou
cujo labor sacudiu o edifício religioso do Velho Mundo e preparou os no-
vos fundamentos que deveriam servir de base à evolução e à renovação da
nossa sociedade caduca, impelindo-a para um ideal mais são, mais elevado,
para um adiantamento intelectual e moral seguros.
Foi, com efeito, em Lyon, que, a 3 de outubro de 1804, nasceu de
antiga família lionesa, com o nome de Rivail, aquele que devia mais tarde
ilustrar o nome de Allan Kardec e conquistar para ele tantos títulos à nossa
profunda simpatia, ao nosso filial reconhecimento.
Eis aqui a esse respeito um documento positivo e oficial:
“Aos 12 do vindemiário 2 do ano XIII, auto do nascimento de
Denizard Hippolyte-Léon Rivail, nascido ontem às 7 horas da noite, filho
de Jean-Baptiste Antoine Rivail, magistrado, juiz, e Jeanne Duhamel, sua
esposa, residentes em Lyon, rua Sala, número 76,
O sexo da criança foi reconhecido como masculino.
Testemunhas maiores:
Syriaque-Frédéric Dittmar, diretor do estabelecimento das águas mi-
nerais da rua Sala, e Jean-François Targe, mesma rua Sala, à requisição do
médico Pierre Radamel, rua Saint-Dominique, n 78.
Feita a leitura, as testemunhas assinaram, assim como o Maire da região do Sul.
O presidente do Tribunal.”
(assinado):Mathiou
O futuro fundador do Espiritismo recebeu desde o berço um nome
querido e respeitado e todo um passado de virtudes, de honra, de probi-
dade; grande número dos seus antepassados se tinham distinguido na ad-
vocacia e na magistratura, por seu talento, saber e escrupulosa probidade.
Parecia que o jovem Rivail devia sonhar, também ele, com os louros e as
glórias da sua família. Assim, porém, não foi, porque, desde o começo da
sua juventude, ele se sentiu atraído para as Ciências e para a Filosofia.
Rivail Denizard fez em Lyon os seus primeiros estudos e completou
em seguida a sua bagagem escolar, em Yverdun (Suíça), com o célebre pro-
fessor Pestalozzi, de quem cedo se tornou um dos mais eminentes discípu-
los, colaborador inteligente e dedicado. Aplicou-se, de todo o coração, à
2 N.E.: Veja-se Reformador de abril de 1947, p. 85.
propaganda do sistema de educação que exerceu tão grande influência sobre
a reforma dos estudos na França e na Alemanha. Muitíssimas vezes, quando
Pestalozzi era chamado pelos governos, um pouco de todos os lados, para
fundar institutos semelhantes ao de Yverdun, confiava a
Denizard Rivail o
encargo de o substituir na direção da sua escola. O discípulo tornado mestre
tinha, além de tudo, com os mais legítimos direitos, a capacidade requerida
para dar boa conta da tarefa que lhe era confiada. Era bacharel em Letras e
em Ciências e doutor em Medicina, tendo feito todos os estudos médicos
e defendido brilhantemente sua tese.
Linguista insigne, conhecia a fundo e falava corretamente o alemão, o inglês, o italiano e o espanhol; conhecia
também o holandês, e podia facilmente exprimir-se nesta língua.
Denizard Rivail era um alto e belo rapaz, de maneiras distintas, hu-
mor jovial na intimidade, bom e obsequioso. Tendo-o a conscrição incluí-
do para o serviço militar, ele obteve isenção e, dois anos depois, veio fundar
em Paris, à rua de Sèvres, n 35, um estabelecimento semelhante ao de
Yverdun. Para essa empresa se associara a um dos seus tios, irmão de sua
mãe, o qual era seu sócio capitalista.
No mundo das letras e do ensino, que frequentava em Paris,
Denizard
Rivail encontrou a Srta. Amélie Boudet, professora com diploma de
1a classe.
Pequena, mas bem-proporcionada, gentil e graciosa, rica por seus
pais e filha única, inteligente e viva, ela soube por seu sorriso e predicados
fazer-se notar pelo Sr. Rivail, em quem adivinhou, sob a franca e comuni-
cativa alegria do homem amável, o pensador sábio e profundo, que aliava
grande dignidade à mais esmerada urbanidade.
O registro civil nos informa que:
“Amélie-Gabrielle Boudet, filha de Julien-Louis Boudet, proprietá-
rio e antigo tabelião, e de Julie-Louise Seigneat de Lacombe, nasceu em
Thiais (Sena), aos 2 do Frimário do ano IV (23 de novembro de 1795).”
A Srta. Amélie Boudet tinha, pois, mais nove anos que o Sr.
Rivail, mas na aparência dir-se-ia ter menos dez que ele, quando, em
6 de fevereiro de 1832, se firmou em Paris o contrato de casamento de
Hippolyte-Léon-Denizard Rivail, diretor do Instituto Técnico à rua de
Sèvres (Método de Pestalozzi), filho de Jean-Baptiste Antoine e senhora,
Jeanne Duhamel, residentes em Château-du-Loir, com Amélie-Gabrielle
também o holandês, e podia facilmente exprimir-se nesta língua.
Denizard Rivail era um alto e belo rapaz, de maneiras distintas, hu-
mor jovial na intimidade, bom e obsequioso. Tendo-o a conscrição incluí-
do para o serviço militar, ele obteve isenção e, dois anos depois, veio fundar
em Paris, à rua de Sèvres, n 35, um estabelecimento semelhante ao de
Yverdun. Para essa empresa se associara a um dos seus tios, irmão de sua
mãe, o qual era seu sócio capitalista.
No mundo das letras e do ensino, que frequentava em Paris,
Denizard
Rivail encontrou a Srta. Amélie Boudet, professora com diploma de
1a classe.
Pequena, mas bem-proporcionada, gentil e graciosa, rica por seus
pais e filha única, inteligente e viva, ela soube por seu sorriso e predicados
fazer-se notar pelo Sr. Rivail, em quem adivinhou, sob a franca e comuni-
cativa alegria do homem amável, o pensador sábio e profundo, que aliava
grande dignidade à mais esmerada urbanidade.
O registro civil nos informa que:
“Amélie-Gabrielle Boudet, filha de Julien-Louis Boudet, proprietá-
rio e antigo tabelião, e de Julie-Louise Seigneat de Lacombe, nasceu em
Thiais (Sena), aos 2 do Frimário do ano IV (23 de novembro de 1795).”
A Srta. Amélie Boudet tinha, pois, mais nove anos que o Sr.
Rivail, mas na aparência dir-se-ia ter menos dez que ele, quando, em
6 de fevereiro de 1832, se firmou em Paris o contrato de casamento de
Hippolyte-Léon-Denizard Rivail, diretor do Instituto Técnico à rua de
Sèvres (Método de Pestalozzi), filho de Jean-Baptiste Antoine e senhora,
Jeanne Duhamel, residentes em Château-du-Loir, com Amélie-Gabrielle
Boudet, filha de Julien-Louis e senhora Julie-Louise Seigneat de Lacombe,
residentes em Paris, rua de Sèvres, n 35.
O sócio do Sr. Rivail tinha a paixão do jogo; arruinou o sobrinho,
perdendo grossas somas em Spa e em Aix-la-Chapelle. O Sr. Rivail reque-
reu a liquidação do Instituto, de cuja partilha couberam 45.000 francos a
cada um deles. Essa soma foi colocada pelo Sr. e Sra. Rivail em casa de um
dos seus amigos íntimos, negociante, que fez maus negócios e cuja falência
nada deixou aos credores.
Longe de desanimar com esse duplo revés, o Sr. e Sra. Rivail lan-
çaram-se corajosamente ao trabalho. Ele encontrou e pôde encarregar-se
da contabilidade de três casas, que lhe produziam cerca de 7.000 francos
por ano; e, terminado o seu dia, esse trabalhador infatigável escrevia à
noite, ao serão, gramáticas, aritméticas, livros para estudos pedagógicos
superiores; traduzia obras inglesas e alemãs e preparava todos os cursos de
Levy-Alvarès, frequentados por discípulos de ambos os sexos do
faubourg
Saint-Germain. Organizou também em sua casa, à rua de Sèvres, cursos
gratuitos de Química, Física, Astronomia e Anatomia comparada, de 1835
a 1840, e que eram muito frequentados.
Membro de várias sociedades sábias, notadamente da Academia Real
d’Arras, foi premiado, por concurso, em 1831, pela apresentação da sua
notável memória:
Qual o sistema de estudo mais em harmonia com as neces-
sidades da época?
Dentre as suas numerosas obras convém citar, por ordem cronológi-
ca:
Plano apresentado para o melhoramento da instrução pública
em 1828; em 1829
segundo o método de Pestalozzi, ele publicou, para uso das mães
de família e dos professores, o
Curso prático e teórico de Aritmética ; em 1831 fez aparecer a
Gramática francesa clássica em 1846, o Manual dos exames
para obtenção dos diplomas de capacidade
, soluções racionais das questões
e problemas de Aritmética e Geometria; em 1848 foi publicado o
Catecismo gramatical da língua francesa
finalmente, em 1849,
encontramos o
Sr. Rivail professor no Liceu Polimático, regendo as cadeiras de Fisiologia,
Astronomia, Química e Física. Em uma obra muito apreciada resume seus
cursos, e depois publica:
Ditados normais dos exames na Municipalidade e
na Sorbonne
;
Ditados especiais sobre as dificuldades ortográficas
Tendo sido essas diversas obras adotadas pela Universidade de
França, e vendendo-se abundantemente, pôde o Sr. Rivail conseguir, gra-
ças a elas e ao seu assíduo trabalho, uma modesta abastança. Como se pode
julgar por esta muito rápida exposição, o Sr. Rivail estava admiravelmente
preparado para a rude tarefa que ia ter que desempenhar e fazer triunfar.
Seu nome era conhecido e respeitado, seus trabalhos justamente aprecia-
dos, muito antes que ele imortalizasse o nome de Allan Kardec.
Prosseguindo em sua carreira pedagógica, o Sr. Rivail poderia viver
feliz, honrado e tranquilo, estando a sua fortuna reconstruída pelo traba-
lho perseverante e pelo brilhante êxito que lhe havia coroado os esforços,
mas a sua missão o chamava a uma tarefa mais onerosa, a uma obra maior,
e, como teremos muitas vezes ocasião de o evidenciar, ele sempre se mos-
trou à altura da missão gloriosa que lhe estava reservada. Seus pendores,
suas aspirações, tê-lo-iam impelido para o misticismo, mas a educação, o
juízo reto, a observação metódica, conservaram-no igualmente ao abrigo
dos entusiasmos desarrazoados e das negações não justificadas.
Foi em 1854 que o Sr. Rivail ouviu pela primeira vez falar nas mesas
girantes, a princípio do Sr. Fortier, magnetizador, com o qual mantinha
relações, em razão dos seus estudos sobre o Magnetismo. O Sr. Fortier lhe
disse um dia: “Eis aqui uma coisa que é bem mais extraordinária: não so-
mente se faz girar uma mesa, magnetizando-a, mas também se pode fazê-la
falar. Interroga-se, e ela responde.”
— Isso, replicou o Sr. Rivail — é uma outra questão; eu acreditarei
quando vir e quando me tiverem provado que uma mesa tem cérebro para
pensar, nervos para sentir, e que se pode tornar sonâmbula. Até lá, permita-
-me que não veja nisso senão uma fábula para provocar o sono.
Tal era a princípio o estado de espírito do Sr. Rivail, tal o encontra-
remos muitas vezes, não negando coisa alguma por
parti pris
, mas pedindo
provas e querendo ver e observar para crer; tais nos devemos mostrar sem-
pre no estudo tão atraente das manifestações do Além
Até agora, não vos falei senão do Sr. Rivail, professor emérito, autor
pedagógico de renome. Nessa época, porém, da sua vida, de 1854 a 1856,
um novo horizonte se rasga para esse pensador profundo, para esse sagaz
observador. Então o nome de Rivail se obumbra, para ceder o lugar ao de
Allan Kardec, que a fama levará a todos os cantos do globo, que todos os
ecos repetirão e que todos os nossos corações idolatram.
Eis aqui como Allan Kardec nos revela as suas dúvidas, as suas hesi-
tações e também a sua primeira iniciação:
“Eu me encontrava, pois, no ciclo de um fato inexplicado, contrário,
na aparência, às Leis da natureza e que minha razão repelia. Nada tinha ain-
da visto nem observado; as experiências feitas em presença de pessoas hon-
radas e dignas de fé me firmavam na possibilidade do efeito puramente ma-
terial, mas a ideia, de uma mesa falante, não me entrava ainda no cérebro.
No ano seguinte — era no começo de 1855 — encontrei o Sr.
Carlotti, um amigo de há vinte e cinco anos, que discorreu acerca desses
fenômenos durante mais de uma hora, com o entusiasmo que ele punha
em todas as ideias novas. O Sr. Carlotti era corso de origem, de natureza
ardente e enérgica; eu tinha sempre distinguido nele as qualidades que ca-
racterizam uma grande e bela alma, mas desconfiava da sua exaltação. Ele
foi o primeiro a falar-me da intervenção dos Espíritos, e contou-me tantas
coisas surpreendentes que, longe de me convencerem, aumentaram as mi-
nhas dúvidas. — Você um dia será dos nossos — disse-me ele. — Não digo
que não — respondi-lhe eu —; veremos isso mais tarde.
Daí a algum tempo, pelo mês de maio de 1855, estive, em casa da
sonâmbula Sra. Roger, com o Sr. Fortier, seu magnetizador. Lá encontrei o
Sr. Pâtier e a Sra. Plainemaison, que me falaram desses fenômenos no mes-
mo sentido que o Sr. Carlotti, mas noutro tom. O Sr. Pâtier era funcionário
público, de certa idade, homem muito instruído, de caráter grave, frio e
calmo; sua linguagem pausada, isenta de todo entusiasmo, produziu-me
viva impressão, e, quando ele me convidou para assistir às experiências que
se realizavam em casa da Sra. Plainemaison, rua Grange-Batelière, n18,
18,aceitei com solicitude. A entrevista foi marcada para a terça-feira
de maio, às 8 horas da noite.
Foi aí, pela primeira vez, que testemunhei o fenômeno das mesas
girantes, que saltavam e corriam, e isso em condições tais que a dúvida não
era possível.
Aí vi também alguns ensaios muito imperfeitos de escrita mediúnica
em uma ardósia com o auxílio de uma cesta. Minhas ideias estavam longe
de se haver modificado, mas naquilo havia um fato que devia ter uma causa
5
N.T.: Esta data ficou em branco no manuscrito de Allan Kardec.
Entrevi, sob essas aparentes futilidades e a espécie de divertimento que
com esses fenômenos se fazia, alguma coisa de sério e como que a revelação
de uma nova lei, que a mim mesmo prometi aprofundar.
A ocasião se me ofereceu e pude observar mais atentamente do que ti-
nha podido fazer. Em um dos serões da Sra. Plainemaison, fiz conhecimento
com a família Baudin, que morava então à rua Rochechouart. O Sr. Baudin
fez-me oferecimento no sentido de assistir às sessões hebdomadárias que se
efetuavam em sua casa, e às quais eu fui, desde esse momento, muito assíduo.
Foi aí que fiz os meus primeiros estudos sérios em Espiritismo, me-
nos ainda por efeito de revelações que por observação. Apliquei a essa nova
ciência, como até então o tinha feito, o método da experimentação; nunca
formulei teorias preconcebidas; observava atentamente, comparava, dedu-
zia as consequências; dos efeitos procurava remontar às causas pela de-
dução, pelo encadeamento lógico dos fatos, não admitindo como válida
uma explicação, senão quando ela podia resolver todas as dificuldades da
questão. Foi assim que sempre procedi em meus trabalhos anteriores, des-
de a idade de 15 a 16 anos. Compreendi, desde o princípio, a gravidade
da exploração que ia empreender. Entrevi nesses fenômenos a chave do
problema tão obscuro e tão controvertido do passado e do futuro, a solu-
ção do que havia procurado toda a minha vida; era, em uma palavra, uma
completa revolução nas ideias e nas crenças; preciso, portanto, se fazia agir
com circunspeção, e não levianamente; ser positivista, e não idealista, para
me não deixar arrastar pelas ilusões.
Um dos primeiros resultados das minhas observações foi que os Es-
píritos, não sendo senão as almas dos homens, não tinham nem a soberana
sabedoria, nem a soberana ciência; que o seu saber era limitado ao grau do
seu adiantamento, e que a sua opinião não tinha senão o valor de uma opi-
nião pessoal. Esta verdade, reconhecida desde o começo, evitou-me o grave
escolho de crer na sua infalibilidade e preservou-me de formular
teorias
prematuras sobre a opinião de um só ou de alguns.
Só o fato da comunicação com os Espíritos, o que quer que eles pu-
dessem dizer, provava a existência de um mundo invisível ambiente; era já
um ponto capital, um imenso campo franqueado às nossas explorações, a
chave de uma multidão de fenômenos inexplicados. O segundo ponto, não
menos importante, era conhecer o estado desse mundo e seus costumes, se
assim nos podemos exprimir. Cedo, observei que cada Espírito, em razão
de sua posição pessoal e de seus conhecimentos, desvendava-me uma fase
desse mundo, exatamente como se chega a conhecer o estado de um país
interrogando os habitantes de todas as classes e condições, podendo cada
qual nos ensinar alguma coisa e nenhum deles podendo, individualmente,
ensinar-nos tudo. Cumpre ao observador formar o conjunto, com o auxílio
dos documentos recolhidos de diferentes lados, colecionados, coordenados
e confrontados entre si. Eu, pois, agi com os Espíritos como o teria feito
com os homens: eles foram, para mim, desde o menor até o mais elevado,
meios de colher informações, e não reveladores predestinados
A estas informações, colhidas nas
Obras póstumas de Allan Kardec,
convém acrescentar que a princípio o Sr. Rivail, longe de ser um entu-
siasta dessas manifestações e absorvido por outras preocupações, esteve a
ponto de as abandonar, o que talvez tivesse feito se não fossem as instantes
solicitações dos Srs. Carlotti, René Taillandier, membro da Academia das
Ciências, Tiedeman-Manthèse, Sardou, pai e filho, e Didier, editor, que
acompanhavam havia cinco anos o estudo desses fenômenos e tinham reu-
nido cinquenta cadernos de comunicações diversas, que não conseguiam pôr
em ordem. Conhecendo as vastas e raras aptidões de síntese do Sr. Rivail,
esses senhores lhe enviaram os cadernos, pedindo-lhe que deles tomasse
conhecimento e os pusesse em termos —, os arranjasse. Este trabalho era
árduo e exigia muito tempo, em virtude das lacunas e obscuridades dessas
comunicações; e o sábio enciclopedista recusava-se a essa tarefa enfadonha
e absorvente, em razão de outros trabalhos.
Uma noite, seu Espírito protetor, Z., deu-lhe, por um médium, uma
comunicação toda pessoal, na qual lhe dizia, entre outras coisas, tê-lo co-
nhecido em uma precedente existência, quando, ao tempo dos Druidas,
viviam juntos nas Gálias. Ele se chamava, então, Allan Kardec, e, como a
amizade que lhe havia votado só fazia aumentar, prometia-lhe esse Espírito
secundá-lo na tarefa muito importante a que ele era chamado, e que facil-
mente levaria a termo.
O Sr. Rivail, pois, lançou-se à obra: tomou os cadernos, anotou-
-os com cuidado. Após atenta leitura, suprimiu as repetições e pôs na
respectiva ordem cada ditado, cada relatório de sessão; assinalou as lacunas
a preencher, as obscuridades a aclarar, e preparou as perguntas necessárias
para chegar a esse resultado.
“Até então”, diz ele próprio, “as sessões em casa do Sr. Baudin não
tinham nenhum fim determinado; propus-me, aí, fazer resolver os proble-
mas que me interessavam sob o ponto de vista da Filosofia, da Psicologia e
da natureza do mundo invisível. Comparecia a cada sessão com uma série
de questões preparadas e metodicamente dispostas: eram respondidas com
precisão, profundeza e de modo lógico. Desde esse momento as reuniões ti-
veram caráter muito diferente, e, entre os assistentes, encontravam-se pessoas
sérias que tomaram vivo interesse pelo trabalho. Se me acontecia faltar, fica-
vam as sessões como que tolhidas, tendo as questões fúteis perdido o atrativo
para o maior número. A princípio eu não tinha em vista senão a minha pró-
pria instrução; mais tarde, quando vi que tudo aquilo formava um conjunto
e tomava as proporções de uma doutrina, tive o pensamento de o publicar,
para instrução de todos. Foram essas mesmas questões que, sucessivamente
desenvolvidas e completadas, fizeram a base de O livro dos espíritos
Em 1856, o Sr. Rivail frequentou as reuniões espíritas que se reali-
zavam à rua Tiquetonne, em casa do Sr. Roustan, com Mlle. Japhet, so-
nâmbula, que obtinha como médium comunicações muito interessantes,
com o auxílio da cesta aguçada;fez examinar por esse médium as comu-
nicações obtidas e postas precedentemente em ordem. Esse trabalho foi
efetuado, a princípio, nas sessões ordinárias; mas a pedido dos Espíritos,
e para que fosse consagrado mais cuidado, mais atenção a esse exame, foi
continuado em sessões particulares.
“Não me contentei com essa verificação”, diz ainda Allan Kardec,
“que os Espíritos me haviam recomendado. Tendo-me as circunstâncias
posto em relação com outros médiuns, toda vez que se oferecia ocasião,
eu a aproveitava para propor algumas das questões que me pareciam mais
melindrosas. Foi assim que mais de dez médiuns prestaram seu concurso
a esse trabalho. E foi da comparação e da fusão de todas essas respostas,
coordenadas, classificadas e muitas vezes refeitas no silêncio da meditação,
que formei a primeira edição de O livro dos espíritos
, a qual apareceu em 18 de abril de 1857.”
Esse livro era em formato grande, in-4, em duas colunas, uma para
as perguntas e outra, em frente, para as respostas. No momento de publicá-
-lo, o autor ficou muito embaraçado em resolver como o assinaria, se com
o seu nome — Hippolyte-Léon-Denizard Rivail, ou com um pseudônimo
Sendo o seu nome muito conhecido do mundo científico, em virtude dos
seus trabalhos anteriores, e podendo originar uma confusão, talvez mesmo
prejudicar o êxito do empreendimento, ele adotou o alvitre de o assinar
com o nome de Allan Kardec que, segundo lhe revelara o guia, ele tivera ao
tempo dos Druidas.
A obra alcançou tal êxito que a primeira edição foi logo esgotada.
Allan Kardec reeditou-a em 1858 sob a forma atual in-12, revista, correta
e consideravelmente aumentada.
No dia 25 de março de 1856 estava Allan Kardec em seu gabinete de
trabalho, em via de compulsar as comunicações e preparar
O livro dos espíritos, quando ouviu ressoarem pancadas repetidas no tabique procurou,
quando ouviu ressoarem pancadas repetidas no tabique; procurou,
sem descobrir, a causa disso, e em seguida tornou a pôr mãos à obra. Sua
mulher, entrando cerca das 10 horas, ouviu os mesmos ruídos; procura-
ram, mas sem resultado, de onde podiam eles provir. Moravam, então, à
rua dos Martyrs, n 8 no segundo andar, ao fundo.
“No dia seguinte, sendo dia de sessões em casa do Sr. Baudin”, escre-
ve Allan Kardec, “contei o fato e pedi a explicação dele.
Pergunta: — Ouvistes o fato que acabo de narrar; podereis dizer-me
a causa dessas pancadas que se fizeram ouvir com tanta insistência?
Resposta: — Era o teu Espírito familiar.
P. — Com que fim, vinha ele bater assim?
R. — Queria comunicar-se contigo.
P. — Podereis dizer-me o que queria ele?
R. — Podes perguntar a ele mesmo, porque está aqui.
P. — Meu Espírito familiar, quem quer que sejais, agradeço-vos ter-
des vindo visitar-me. Quereis ter a bondade de dizer-me quem sois?
R. — Para ti chamar-me-ei a
Verdade
, e todos os meses, durante um
quarto de hora, estarei aqui, à tua disposição.
P. — Ontem, quando batíeis, enquanto eu trabalhava, tínheis algu-
ma coisa de particular a dizer-me?
R. — O que eu tinha a dizer-te era sobre o trabalho que fazias; o que
escrevias me desagradava e eu queria fazer-te parar.
Nota
– O que eu escrevia era precisamente relativo aos estudos que fazia sobre os
Espíritos e suas manifestações.
P. — A vossa desaprovação versava sobre o capítulo que eu escrevia,
ou sobre o conjunto do trabalho?
R. — Sobre o capítulo de ontem: faço-te juiz dele. Torna a lê-lo esta
noite; reconhecer-lhe-ás os erros e os corrigirás.
P. — Eu mesmo não estava muito satisfeito com esse capítulo e o
refiz hoje. Está melhor?
R. — Está melhor, mas não muito bom. Lê da terceira à trigésima
linha e reconhecerás um grave erro.
P. — Rasguei o que tinha feito ontem.
R. — Não importa. Essa inutilização não impede que subsista o
erro. Relê e verás.
P. — O nome de
Verdade
que tomais é uma alusão à verdade que
procuro?
R. — Talvez, ou, pelo menos, é um guia que te há de auxiliar e
proteger.
P. — Posso evocar-vos em minha casa?
R. — Sim, para que eu te assista pelo pensamento; mas, quanto a
respostas escritas em tua casa, não será tão cedo que as poderás obter.
P. — Podereis vir mais frequentemente que todos os meses?
R. — Sim, mas não prometo senão uma vez por mês, até nova
ordem.
P. — Animastes alguma personagem conhecida na Terra?
R. — Disse-te que para ti eu era a Verdade, o que da tua parte devia
importar discrição; não saberás mais que isto.”
De volta a casa, Allan Kardec apressou-se a reler o que escrevera e pôde
verificar o grave erro que com efeito havia cometido. A dilação de um mês,
fixada para cada comunicação do Espírito Verdade, raramente foi observada.
Ele se manifestou frequentemente a Allan Kardec, mas não em
sua casa, onde durante cerca de um ano não pôde este receber nenhuma
comunicação por médium algum e, cada vez que ele esperava obter al-
guma coisa, era obstado por uma causa qualquer e imprevista, que a isso
se vinha opor.
Foi a 30 de abril de 1856, em casa do Sr. Roustan, pela médium
Mlle. Japhet, que Allan Kardec recebeu a primeira revelação da missão
que tinha a desempenhar. Esse aviso, a princípio muito vago, foi precisado
no dia 12 de junho de 1856, por intermédio de Mlle. Aline C., médium.
A 6 de maio de 1857, a Sra. Cardonne, pela inspeção das linhas da mão
de Allan Kardec, confirmou as duas comunicações precedentes, que ela
ignorava. Finalmente, a 12 de abril de 1860, em casa do Sr. Dehau, sendo
intermediário o Sr. Crozet, médium, essa missão foi novamente confirma-
da em uma comunicação espontânea, obtida na ausência de Allan Kardec.
Assim, também, se deu a respeito do seu pseudônimo. Numerosas
comunicações, procedentes dos mais diversos pontos, vieram reafirmar e
corroborar a primeira comunicação obtida a esse respeito.
Urgido pelos acontecimentos e pelos documentos que tinha em seu
poder, Allan Kardec formara, em razão do êxito de O livro dos espíritos
projeto de criar um jornal espírita. Havia-se dirigido ao Sr. Tiedman, para
solicitar-lhe o concurso pecuniário, mas este não estava resolvido a tomar
parte nessa empresa. Allan Kardec perguntou aos seus guias, no dia 15
de novembro de 1857, por intermédio da Srta. E. Dufaux, o que deveria
fazer. Foi-lhe respondido que pusesse a sua ideia em execução e que não se
inquietasse com o resto.
“Apressei-me em redigir o primeiro número”, diz Allan Kardec, “e o fiz
Aparecer no dia 1de janeiro de 1858, sem nada dizer a pessoa alguma. Não
tinha um único assinante, nem sócio capitalista. Fi-lo, pois, inteiramente por
minha conta e risco, e não tive de que me arrepender, porque o êxito ultra-
passou a minha expectativa. A partir de 1de janeiro, os números se sucede-
ram sem interrupção, e, como o previra o Espírito, esse jornal se me tornou
em poderoso auxiliar. Reconheci, mais tarde, que era uma felicidade para
mim não ter tido um sócio capitalista, porque estava mais livre, enquanto
que um estranho interessado teria pretendido impor-me as suas ideias e a sua
vontade e poderia embaraçar-me a marcha. Só, eu não tinha que prestar con-
tas a ninguém, por mais onerosa que, como trabalho, fosse a minha tarefa.”
E essa tarefa devia ir sempre crescendo em labor e em responsabili-
dades, em lutas incessantes contra obstáculos, emboscadas, perigos de toda
sorte. À medida, porém, que a lide se tornava mais áspera, esse enérgico
trabalhador se elevava, também, à altura dos acontecimentos, que nunca o
surpreenderam; e durante onze anos, nessa Revista espírita , que acabamos
de ver como começou tão modestamente, ele afrontou todas as tempes-
tades, todas as emulações, todos os ciúmes que não lhe foram poupados,
como ele mesmo relata e como lhe fora anunciado ao ser-lhe revelada a sua
missão. Essa comunicação e as reflexões de que as anotou Allan Kardec nos
mostram, sob um prisma pouco lisonjeiro, a situação naquela época, mas
fazem também ressaltar o grande valor do fundador do Espiritismo e o seu
mérito em ter sabido triunfar:
Médium, Mlle. Aline C. – 12 de junho de 1856:
P. — Quais são as causas que me poderiam fazer fracassar? Seria a
insuficiência das minhas aptidões?
R. — Não, mas a missão dos reformadores é cheia de escolhos e pe-
rigos; a tua é rude; previno-te, porque é ao mundo inteiro que se trata de
agitar e de transformar. Não creias que te seja suficiente publicar um livro,
dois livros, dez livros, e ficares tranquilamente em tua casa; não, é preciso
te mostrares no conflito; contra ti se açularão terríveis ódios, implacáveis
inimigos tramarão a tua perda; estarás exposto à calúnia, à traição, mesmo
daqueles que te parecerão mais dedicados; as tuas melhores instruções serão
impugnadas e desnaturadas; sucumbirás mais de uma vez ao peso da fadiga;
em uma palavra, é uma luta quase constante que terás de sustentar com o
sacrifício do teu repouso, da tua tranquilidade, da tua saúde e mesmo da
tua vida, porque tu não viverás muito tempo. Pois bem. Mais de um recua
quando, em lugar de uma vereda florida, não encontra sob seus passos senão
espinhos, agudas pedras e serpentes. Para tais missões não basta a inteligên-
cia. É preciso antes de tudo, para agradar a Deus, humildade, modéstia, de-
sinteresse, porque abatem os orgulhosos e os presunçosos. Para lutar contra
os homens, é necessário coragem, perseverança e firmeza inquebrantáveis; é
preciso, também, ter prudência e tato para conduzir as coisas a propósito e
não comprometer-lhes o êxito por medidas ou palavras intempestivas; é pre-
ciso, enfim, devotamento, abnegação, e estar pronto para todos os sacrifícios.
“Vês que a tua missão está subordinada a condições que dependem
de ti.”
Espírito Verdade
Quando se conhecem todas essas lutas, todas as torpezas de que
Allan Kardec foi alvo, quanto ele se engrandece aos nossos olhos e como
o seu brilhante triunfo adquire mérito e esplendor! Que se tornaram es-
ses invejosos, esses pigmeus que procuravam obstruir-lhe o caminho? Na
maior parte são desconhecidos os seus nomes, ou nenhuma recordação
despertam mais: o esquecimento os retomou e sepultou para sempre em
suas sombras, ao passo que o de Allan Kardec, o intrépido lutador, o
pioneiro ousado, passará à posteridade com a sua auréola de glória tão
legitimamente adquirida.
A Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas foi fundada a 1de abril
de 1858. Até então, as reuniões se realizavam em casa de Allan Kardec, à
rua dos Martyrs, com Mlle. E. Dufaux, como principal médium; o seu
salão poderia conter de quinze a vinte pessoas. Cedo, aí reuniu ele mais
de trinta. Tornando-se, então, esse local muito acanhado e não querendo
onerar Allan Kardec com todos os encargos, alguns dos assistentes se pro-
puseram formar uma sociedade espírita e alugar um outro local em que se
efetuassem as reuniões. Era preciso, porém, para se poderem reunir, obter
o reconhecimento e a autorização da polícia. O Sr. Dufaux, que conhecia
pessoalmente o prefeito de polícia de então, encarregou-se de dar os passos
para esse fim, e, graças ao ministro do Interior, o general X., que era favo-
rável às novas ideias, a autorização foi obtida em quinze dias, quando pelo
processo ordinário teria exigido meses, sem grande probabilidade de êxito.
“A Sociedade foi, então, regularmente constituída e reunia-se todas
as terças-feiras, no local que fora alugado no Palais-Royal, galeria Valois. Aí
ficou durante um ano, de 1 abril de 1858 a 1 de abril 1859. Não
podendo lá permanecer por mais tempo, reunia-se todas as sextas-feiras em
um dos salões do restaurante Douix, no Palais-Royal, galeria Montpensier,
de 1 abril de 1859 a 1 de abril de 1860, época em que se instalou em
sede própria, à rua e passagem Sainte-Anne, n59"
Depois de haver dado conta das condições em que se formou a So-
ciedade e da tarefa que teve a desempenhar, Allan Kardec assim se exprime
(Revista espírita, julho de 1859):
Dei em minhas funções, que posso dizer laboriosas, toda a exatidão e todo o de-
votamento de que fui capaz. Do ponto de vista administrativo, esforcei-me por
manter nas sessões uma ordem rigorosa e lhes dar um caráter de gravidade, sem
o qual o prestígio de assembleia séria logo teria desaparecido. Agora que a minha
tarefa está terminada e que o impulso foi dado, devo comunicar-vos a resolução
que tomei, de futuramente renunciar a qualquer tipo de função na Sociedade,
mesmo a de diretor de estudos. Não ambiciono senão um título: o de simples
membro titular, com o qual me sentirei sempre honrado e feliz. O motivo de
minha determinação está na multiplicidade de meus trabalhos, que aumentam
diariamente pela extensão de minhas relações, considerando-se que, além daqueles
que
conheceis, preparo outros mais consideráveis, que exigem longos e laborio-
sos estudos e por certo não absorverão menos de dez anos. Ora, os trabalhos da
Sociedade não deixam de tomar muito tempo, tanto na preparação quanto na
coordenação e na redação final. Além disso, reclamam uma assiduidade por vezes
prejudicial às minhas ocupações pessoais e tornam indispensável a iniciativa quase
exclusiva que me conferistes. É por essa razão, senhores, que tantas vezes tive de
tomar a palavra, lamentando que os membros eminentemente esclarecidos que
possuímos nos privassem de suas luzes. Há muito eu desejava demitir-me das
minhas funções; deixei isso bastante claro em diversas circunstâncias, seja aqui,
seja em particular, a vários de meus colegas, notadamente ao Sr. Ledoyen. Tê-lo-ia
feito mais cedo, sem receio de trazer perturbação à Sociedade, retirando-me ao
meio do ano, mas poderia parecer uma defecção, além do que me veria obrigado
a dar satisfação aos nossos adversários. Tive, pois, de cumprir a minha tarefa até
o fim. Hoje, porém, que tais motivos não mais subsistem, apresso-me em vos dar
parte da minha resolução, a fim de não entravar a escolha que fareis. É justo que
cada um participe dos encargos e das honras.
Apressemo-nos a acrescentar que essa demissão não foi aceita e que
Allan Kardec foi reeleito por unanimidade, menos um voto e uma cédula
em branco. Diante desse testemunho de simpatia, ele se submeteu e se
conservou em suas funções.
Em setembro de 1860, Allan Kardec fez uma viagem de propaganda
à nossa região, e eis aqui como a ela fez referência na Sociedade Parisiense
de Estudos Espíritas:
“O Sr. Allan Kardec dá conta do resultado da viagem que acaba de
fazer, no interesse do Espiritismo, e felicita-se pela cordialidade do aco-
lhimento que por toda parte encontrou, especialmente em Sens, Mâcon,
Lyon e Saint-Étienne. Observou, em todo lugar em que se demorou, os
progressos consideráveis da Doutrina; mas o que sobretudo é digno de
nota, é que em parte alguma viu que dela se fizesse um divertimento, mas
que, ao contrário, dela se ocupam de modo sério, e que por toda parte
lhe compreendem o alcance e as consequências futuras. Há, sem dúvida,
muitos adversários, sendo os mais encarniçados os inimigos interessados,
mas os motejadores diminuem sensivelmente; vendo que os seus sarcas-
mos não colocam do seu lado os gracejadores, e que auxiliam mais do que
impedem o progresso das novas crenças, começam a compreender que
nada ganham com isso e que consomem o seu espírito em pura perda, e
assim se calam. Uma frase muito característica parece ser em toda parte
a ordem do dia, e é esta:
o Espiritismo está no ar; só por si desenha ela o
estado das coisas. Mas é sobretudo em Lyon que são mais notáveis os
resultados. Os espíritas são, aí, numerosos em todas as classes, e na classe
operária contam-se por centenas. A Doutrina Espírita tem exercido sobre
os operários a mais salutar influência, sob o ponto de vista da ordem, da
moral e das ideias religiosas; em resumo, a propagação do Espiritismo
marcha com a mais animadora celeridade.”
No decurso dessa viagem, Allan Kardec pronunciou um discurso
magistral, no banquete realizado a 19 de setembro de 1860, do qual eis
aqui algumas passagens, próprias a nos interessar, a nós que aspiramos a
substituir dignamente esses trabalhadores da primeira hora:
“A primeira coisa que me impressionou foi o número de adeptos;
eu sabia perfeitamente que Lyon os contava em grande escala, mas esta-
va longe de imaginar que o número fosse tão considerável, porque é por
centenas que eles se contam, e, em pouco tempo — eu o espero —, já se
não poderão contar mais.
Se, porém, Lyon se distingue pelo número, não o faz menos pela qua-
lidade, o que ainda vale mais. Por toda parte não encontrei senão espíritas
sinceros, compreendendo a Doutrina sob seu verdadeiro ponto de vista.
Há, meus senhores, três categorias de adeptos: uns que se limitam a crer na
realidade das manifestações e que procuram, antes de tudo, os fenômenos;
o Espiritismo é simplesmente para eles uma série de fatos mais ou menos
interessantes. Os segundos veem outra coisa nele além dos fatos, compreen-
dem o seu alcance filosófico, admiram a moral que deles decorre, mas não
a praticam; para eles, a caridade cristã é uma bela máxima, e nada mais. Os
terceiros, finalmente, não se contentam de admirar a moral: praticam-na e
aceitam-lhe as consequências. Bem convencidos de que a existência terrestre
é uma prova passageira, esforçam-se por aproveitar esses curtos instantes,
para marchar na senda do progresso que lhes traçam os Espíritos, empe-
nhando-se em fazer o bem e em reprimir as suas más inclinações; as suas
relações são sempre seguras, porque as suas convicções os afastam de todo
pensamento do mal; a caridade é, em toda ocasião, a regra da sua conduta:
são esses os verdadeiros espiritas, ou melhor, os espíritas cristãos
Pois bem, meus senhores, eu vo-lo digo com satisfação: ainda não en-
contrei, aí, nenhum adepto da primeira categoria; em parte alguma vi que
se ocupassem do Espiritismo por mera curiosidade, com frívolos intuitos;
por toda parte o fim é grave, as intenções são sérias; e, a crer no que me
dizem, há muitos da terceira categoria. Honra, pois, aos espíritas lioneses,
por terem, assim, entrado largamente nessa senda progressista, sem a qual
o Espiritismo não teria objetivo. Este exemplo não será
perdido, terá suas
consequências, e não é sem razão — eu o vejo — que os Espíritos me res-
ponderam noutro dia, por um dos vossos médiuns mais dedicados, posto
que dos mais obscuros, quando eu lhes exprimia a minha surpresa: ‘Por que
te admiras disso? Lyon foi a cidade dos mártires; a fé aí é vivaz; ela fornecerá
apóstolos ao Espiritismo. Se Paris é a cabeça, Lyon será o coração.’”
Essa opinião de Allan Kardec, sobre os espíritas lioneses de sua épo-
ca, é para nós uma grande honra, mas deve ser também uma regra de
conduta. Devemos esforçar-nos por merecer esses elogios, aprofundando
por nossa vez as lições do mestre e, sobretudo, conformando com elas o
nosso proceder. Noblesse oblige,8
diz um adágio; saibamo-nos recordar sem-
pre disso e conservar alto e firme o estandarte do Espiritismo.
Allan Kardec, porém, não se contentava em atirar flores sobre nossos
companheiros; dava-lhes, sobretudo, sábios conselhos, sobre os quais, por
nossa vez, deveremos meditar.
“Vindo dos Espíritos o ensino, os diferentes grupos, tanto como os
indivíduos, se acham sob a influência de certos Espíritos que presidem aos
seus trabalhos, ou os dirigem moralmente. Se esses Espíritos não se acham
de acordo, a questão está em saber qual é o que merece maior confiança;
será, evidentemente, aquele cuja teoria não pode provocar nenhuma objeção
séria, em uma palavra, aquele que, em todos os pontos, dá maior número de
provas de superioridade. Se tudo nesse ensino é bom, racional, pouco im-
porta o nome que toma o Espírito; e a esse respeito a questão de identidade
é inteiramente secundária. Se, sob um nome respeitável, o ensino peca pelas
qualidades essenciais, podeis imediatamente concluir que é um nome apó-
crifo e que é um Espírito impostor ou galhofeiro. Regra geral: o nome nunca
é uma garantia; a única, a verdadeira garantia de superioridade é o pensa-
mento e a maneira por que é ele expresso. Os
Espíritos enganadores tudo
podem imitar, tudo, exceto o verdadeiro saber e o verdadeiro sentimento.
Acontece muitas vezes que, para fazer adotar certas utopias, alguns
Espíritos fazem alarde de um falso saber e pensam impô-las, escolhendo
no arsenal das palavras técnicas tudo o que pode fascinar aquele que é
facilmente crédulo. Eles têm, ainda, um meio mais certo: é afetar as ex-
terioridades da virtude; com o auxílio das grandes palavras — caridade,
fraternidade, humildade — esperam fazer passar os mais grosseiros ab-
surdos e é o que acontece muitas vezes, quando se não está precavido. É
preciso, pois, evitar o deixar-se seduzir pelas aparências, tanto da parte dos
Espíritos, quanto da dos homens; ora, eu o confesso, aí está uma das maio-
res dificuldades, mas nunca se disse que o Espiritismo fosse uma ciência fá-
cil; tem seus escolhos que se não podem evitar senão pela experiência. Para
escapar à cilada, é preciso, antes de tudo, fugir ao entusiasmo que cega,
ao orgulho que leva certos médiuns a acreditarem-se os únicos intérpretes
da verdade; é preciso que tudo seja friamente examinado, maduramente
pesado,
confrontado, e, se desconfiamos do próprio julgamento, o que é
muitas vezes mais prudente, é preciso recorrer a outras pessoas, segundo o
8
N.E.: A nobreza obriga.
provérbio: que quatro olhos veem melhor do que dois. Só um falso amor-
-próprio ou uma obsessão podem fazer persistir em uma ideia notoriamen-
te falsa e que o bom senso de cada um repele.”
Eis os conselhos tão sábios e tão práticos dados por aqueles que qui-
seram fazer passar por um entusiasta, um místico, um alucinado; e essa
regra de conduta, estabelecida no começo, ainda não foi invalidada, nem
pela observação, nem pelos acontecimentos; é sempre a vereda mais segu-
ra, mais prudente, a única a seguir por aqueles que se querem ocupar do
Espiritismo. Allan Kardec trabalhava, então, em O livro dos médiuns,
que apareceu ,na primeira quinzena de janeiro de 1861, editado pelos Srs. Didier
& Cia., livreiros-editores. O mestre expõe a sua razão de ser nos seguintes
termos, na
Revista espírita
:
Fruto de longa experiência e de laboriosos estudos, nesse trabalho procuramos
esclarecer todas as questões que se ligam à prática das manifestações. De acordo
com os Espíritos, contém a explicação teórica dos diversos fenômenos, bem como
das condições em que os mesmos se podem reproduzir. Não obstante, sobretudo
a matéria relativa ao desenvolvimento e ao exercício da mediunidade mereceu de
nossa parte uma atenção toda especial.
O Espiritismo experimental é cercado de muito mais dificuldades do que geral-
mente se pensa, e os escolhos aí encontrados são numerosos. É isso que ocasiona
tantas decepções aos que dele se ocupam, sem a experiência e os conhecimentos
necessários. Nosso objetivo foi o de prevenir contra esses escolhos, que nem sem-
pre deixam de apresentar inconvenientes para quem se aventure sem prudência
por esse novo terreno. Não podíamos negligenciar um ponto tão capital, e o trata-
mos com cuidado que a sua importância reclama.
O livro dos médiuns é, ainda, o vade-mécum de quantos se querem
entregar com proveito à prática do Espiritismo experimental; nada apa-
receu de melhor nem de mais completo nessa ordem de ideias. É ainda o
mais seguro guia de que nos podemos servir para explorar, sem perigo, o
terreno da mediunidade.
•
No ano de 1861, Allan Kardec fez uma nova viagem espírita a Sens,
Mâcon e Lyon, e verificou que em nossa cidade o Espiritismo atingira a
maioridade.
“Com efeito, não é mais por centenas”, diz ele, “que aí se contam os
espíritas, como há um ano; é por milhares, ou, para melhor dizer, já se não
contam, e pode-se calcular que, seguindo a mesma progressão, dentro de
um ano ou dois eles serão mais de trinta mil. O Espiritismo, aí, tem feito
adeptos em todas as classes, mas é sobretudo na classe operária que se tem
propagado com maior rapidez, e isso não é de admirar: sendo essa classe a
que mais sofre, volta-se para o lado que lhe oferece maior consolação. Se
aqueles que clamam contra o Espiritismo lhe oferecessem outro tanto, essa
classe se voltaria para eles; mas, ao contrário, querem tirar-lhe exatamente
aquilo que a ajuda a carregar o seu fardo de miséria. E isto tem sido o meio
mais seguro de perderem as suas simpatias e fazê-la engrossar as nossas filei-
ras. O que vimos com os nossos próprios olhos é de tal modo característico
e encerra ensino tão grande, que acreditamos dever consagrar aos operários
a maior parte do nosso relatório.
No ano passado, só havia um único centro de reunião, o dos
Brotteaux, dirigido por Dijoux, chefe de oficina, e sua mulher; depois,
formaram-se outros em diferentes pontos da cidade: em Guillotière, em
Perrache, em Croix-Rousse, em Vaise, em Saint-Just etc., sem contar gran-
de número de reuniões particulares. Então, havia apenas dois ou três mé-
diuns neófitos; hoje os há em todos os grupos e muitos são de primeira
ordem; em um só grupo vimos cinco escreverem simultaneamente. Vimos,
igualmente, um rapaz muito bom médium vidente, no qual pudemos ve-
rificar essa faculdade desenvolvida no mais alto grau.
Sem dúvida, muito é para desejar que se multipliquem os adeptos,
mas o que mais vale ainda do que o número é a qualidade. Pois bem, de-
claramo-lo bem alto: não vimos, em parte alguma, reuniões espíritas mais
edificantes do que as dos operários lioneses, quanto à ordem, ao recolhi-
mento e à atenção que prestam às instruções dos seus guias espirituais; há
homens, velhos, senhoras, jovens, crianças mesmo, cuja atitude respeitosa
contrasta com a sua idade; jamais uma única criança perturbou por instan-
tes o silêncio das nossas reuniões, muitas vezes longas; pareciam quase tão
ávidas quanto seus pais, em recolher as nossas palavras.
Isto, porém, não é tudo: o número das metamorfoses morais é,
entre os operários, quase tão grande quanto o dos adeptos: hábitos viciosos
reformados, paixões acalmadas, ódios apaziguados, lares tornados tranquilos,
em uma palavra, as mais legítimas virtudes cristãs desenvolvidas, e isso pela
confiança, de agora em diante inabalável, que lhes dão as comunicações espí-
ritas, no futuro em que não acreditavam; é uma felicidade para eles assistirem
a essas instruções, de que saem reconfortados contra a adversidade; muitos
chegam a galgar mais de uma légua, sob qualquer tempo, inverno ou verão,
tudo arrostando para não faltarem a uma sessão; é que neles não há a fé vul-
gar, mas a baseada sobre uma convicção profunda, raciocinada, e não cega.”
Por ocasião dessa viagem, um banquete novamente reuniu sob a
presidência de Allan Kardec os membros da grande família espírita lione-
sa. No dia 19 de setembro de 1860 os convivas eram apenas uns trinta; a
19 de setembro de 1861 o número era de cento e sessenta, “representando
os diferentes grupos, que se consideram todos como membros de uma
grande família, entre os quais não existe sombra de ciúme e de rivalidade,
o que — diz o mestre —, temos, de passagem, grande satisfação em re-
gistrar. A maioria dos assistentes era composta de operários e toda gente
notou a perfeita ordem que não cessou de reinar um só instante. É que
os verdadeiros espíritas põem sua satisfação nas alegrias do coração, e não
nos prazeres ruidosos”.
A 14 de outubro do mesmo ano encontramos Allan Kardec em
Bordeaux, onde, como em todas as cidades por que passava, semeava a Boa
Nova e fazia germinar a fé no futuro.
Além das viagens e dos trabalhos de Allan Kardec, esse ano de 1861
permanecerá memorável nos anais do Espiritismo por um fato de tal modo
monstruoso que quase parece incrível. Refiro-me ao auto de fé levado a
efeito em Barcelona, e em que foram queimadas pela fogueira dos inquisi-
dores trezentas obras espíritas.
O Sr. Maurício Lachâtre estava nessa época estabelecido como li-
vreiro, em Barcelona, em relações e em comunhão de ideias com Allan
Kardec. Assim, pediu a este que lhe enviasse certo número de obras espí-
ritas, para as expor à venda e fazer propaganda da nova filosofia.
Essas obras, em número de trezentas aproximadamente, foram
expedidas nas condições ordinárias, com uma declaração em ordem do
conteúdo das caixas. À sua chegada à Espanha, foram os direitos da al-
fândega cobrados ao destinatário e arrecadados pelos agentes do governo
espanhol, mas a entrega das caixas não se fez: o bispo de Barcelona, tendo
julgado esses livros perniciosos à fé católica, fez confiscar a expedição pelo
Santo Ofício.
Uma vez que não queriam entregar essas obras ao destinatário, Allan
Kardec reclamou a sua devolução, mas a sua reclamação foi de nulo efeito,
e o bispo de Barcelona, erigindo-se em policiador da França, fundamen-
tou a sua recusa com a seguinte resposta: “A Igreja Católica é universal, e
sendo esses livros contrários à fé católica, o governo não pode consentir
que eles passem a perverter a moral e a religião de outros países.”
E não somente esses livros não foram restituídos, mas também os
direitos aduaneiros ficaram em poder do fisco espanhol. Allan Kardec po-
deria promover uma ação diplomática e obrigar o governo espanhol a
efetuar o retorno das obras. Os Espíritos, porém, o dissuadiram disso,
dizendo que era preferível para a propaganda do Espiritismo deixar essa
ignomínia seguir o seu curso.
Renovando os fastos e as fogueiras da Idade Média, o bispo de
Barcelona fez queimar em praça pública, pela mão do carrasco, as obras
incriminadas.
Eis aqui, a título de documento histórico, o processo verbal dessa
infâmia clerical:
“Aos nove dias de outubro de 1861, às 10h30min da manhã, na es-
planada da cidade de Barcelona, no lugar em que são executados os crimi-
nosos condenados à pena última, por ordem do bispo desta cidade foram
queimados trezentos volumes e brochuras sobre o Espiritismo, a saber:
A
Revista espírita
, diretor Allan Kardec;
A
Revista espiritualista
, diretor Piérart;
O livro dos espíritos
, por Allan Kardec;
O livro dos médiuns
, pelo mesmo;
O que é o espiritismo
, pelo mesmo;
Fragmento de sonata
, ditado pelo Espírito Mozart;
Carta de um católico sobre o espiritismo
, pelo Doutor Grand;
A história de Joana d’Arc
, por ela mesma ditada a Mlle. Ermance
Dufaux;
A realidade dos Espíritos demonstrada pela escrita direta
, pelo Barão de
Guldenstubbè.
Assistiram ao auto de fé:
Um padre revestido de hábitos sacerdotais, trazendo em uma das
mãos a cruz e, na outra, uma tocha;
Um tabelião encarregado de redigir o processo verbal do auto de fé;
O escrevente do tabelião;
Um empregado superior da administração das alfândegas;
Três
mozos
9
da alfândega, encarregados de alimentar o fogo;
Um agente da alfândega, representando o proprietário das obras
condenadas pelo bispo;
Uma multidão incalculável aglomerava-se nos passeios e cobria a es-
planada em que ardia a fogueira.
Quando o fogo consumiu os trezentos volumes e brochuras espí-
ritas, o padre e os seus ajudantes se retiraram cobertos pelos apupos e as
maldições dos numerosos assistentes, que gritavam: ‘Abaixo a Inquisição!’
Em seguida muitas pessoas se acercaram da fogueira e apanharam
cinzas.”
Seria diminuir o horror de tais atos, acompanhá-los com a narrati-
va dos comentários; constatemos somente que ao clarão dessa fogueira o
Espiritismo tomou um incremento inesperado em toda a Espanha e, como
o haviam os Espíritos previsto, conquistou, aí, um número incalculável
de adeptos. Só podemos, pois, como o fez Allan Kardec, alegrar-nos com
o grande reclamo que esse ato odioso operou em favor do Espiritismo.
A propósito, porém, da propaganda que nós mesmos devemos fazer da
nossa filosofia, nunca deveremos esquecer estes conselhos do mestre
(
Revista espírita
, dezembro de 1863):
[...] “O Espiritismo se dirige aos que não creem ou que duvidam, e não aos que
têm uma fé e aos quais esta fé basta; que não diz a ninguém que renuncie às
suas crenças para adotar as nossas”, e nisto ele é consequente com os princípios
de tolerância e de liberdade de consciência que professa. Por este motivo não
poderíamos aprovar as tentativas feitas por certas pessoas, para converter às nossas
ideias o clero de qualquer comunhão. Repetiremos, pois, a todos os espíritas:
acolhei prontamente os homens de boa vontade; dai luz aos que a buscam, pois
não tereis êxito com os que julgam possuí-la; não violenteis a fé de ninguém, nem
a do clero, nem a dos laicos, já que vindes semear em campo árido; ponde a luz em
evidência, a fim de que a vejam os que quiserem ver; mostrai os frutos da árvore e
dai a comer aos que têm fome, e não aos que se dizem fartos. [...]
Estes conselhos, como todos os de Allan Kardec, são claros, simples
e sobretudo práticos; cumpre que deles nos recordemos e os aproveitemos
oportunamente.
9
N.E.: Termo em espanhol que significa moço, jovem; empregado, criado
O ano de 1862 foi fértil em trabalhos favoráveis à difusão do Espiri-
tismo. No dia 15 de janeiro apareceu a pequenina e excelente brochura de
propaganda:
O espiritismo na sua expressão mais simples
. “O fim desta pu-
blicação”, diz Allan Kardec, “é apresentar, em quadro muito resumido, um
histórico do Espiritismo e uma ideia suficiente da Doutrina dos Espíritos,
para permitir ser compreendido o seu fim moral e filosófico. Pela clareza e
simplicidade do estilo, procuramos pô-lo ao alcance de todas as inteligên-
cias. Contamos com o zelo de todos os verdadeiros espíritas, para que lhe
auxiliem a propagação.” — Este apelo foi ouvido, porque a pequena bro-
chura se espalhou em profusão, devendo muitos a esse excelente trabalho o
terem compreendido o fim e o alcance do Espiritismo.
Tendo os nossos predecessores no Espiritismo transmitido a Allan
Kardec, por ocasião do Ano-Novo, a expressão dos seus sentimentos de
gratidão, eis aqui como respondeu o mestre a esse testemunho de simpatia:
“Meus caros irmãos e amigos de Lyon:
A manifestação coletiva que tivestes a bondade de transmitir-me,
por ocasião do Ano-Novo, produziu-me vivíssima satisfação, provando-me
que conservastes de mim uma boa recordação, mas o que me causou maior
prazer, nesse ato espontâneo de vossa parte, foi encontrar, entre as numero-
sas assinaturas que nele figuram, representantes de quase todos os grupos,
porque é um sinal da harmonia que reina entre eles. Sou feliz por ver que
compreendestes perfeitamente o fim dessa organização, cujos resultados
desde já podeis apreciar, porque deve ser agora evidente para vós que uma
sociedade única seria quase impossível.
Agradeço, meus bons amigos, os votos que fazeis por mim; eles me
são tanto mais agradáveis quanto sei que partem do coração, e são os que
Deus atende. Ficai, pois, satisfeitos, porque Ele os ouve todos os dias,
proporcionando-me a extraordinária satisfação no estabelecimento de uma
nova Doutrina, de ver aquela a que me tenho dedicado engrandecer e pros-
perar, em minha vida, com uma rapidez maravilhosa; considero um grande
favor do Céu ser testemunha do bem que ela já produz.
Esta certeza, de que recebo diariamente os mais tocantes testemunhos,
me paga com usura todos os meus sofrimentos, todas as minhas fadigas; não
peço a Deus senão uma graça, e é a de dar-me a força física necessária para
ir até o fim da minha tarefa, que longe se encontra de estar concluída, mas,
como quer que suceda, possuirei sempre a maior
consolação, pela certeza de
que a semente das ideias novas, espalhada agora por toda parte, é imperecí-
vel; mais feliz que muitos outros, que não trabalharam senão para o futuro,
é-me permitido contemplar os primeiros frutos.
Se alguma coisa lamento, é que a exiguidade dos meus recursos pes-
soais me não permita pôr em execução os planos que concebi para um
avanço ainda mais rápido; se Deus, porém, em sua sabedoria, entendeu
dispor de modo diferente, legarei esses planos aos nossos sucessores, que,
sem dúvida, serão mais felizes. A despeito da escassez dos recursos mate-
riais, o movimento que se opera na opinião ultrapassou toda a expectativa;
crede, meus irmãos, que nisso o vosso exemplo não terá sido sem influên-
cia. Recebei, portanto, as nossas felicitações pela maneira por que sabeis
compreender e praticar a Doutrina.
No ponto a que hoje chegaram as coisas, e tendo em vista a marcha
do Espiritismo através dos obstáculos semeados em seu caminho, pode
dizer-se que as principais dificuldades estão superadas; ele conquistou o seu
lugar e está assente sobre bases que de ora em diante desafiam os esforços
dos seus adversários.
Perguntam como uma Doutrina, que torna feliz e melhor, pode ter
inimigos; é natural; o estabelecimento das melhores coisas choca sempre
interesses, ao começar. Não tem acontecido assim com todas as invenções e
descobertas que têm revolucionado a indústria? As que hoje são considera-
das como benefícios, sem as quais não se poderia mais passar, não tiveram
inimigos obstinados? Toda lei que reprime um abuso não tem contra si
todos os que vivem dos abusos? Como quereríeis que uma Doutrina que
conduz ao reino da caridade efetiva não fosse combatida por todos os que
vivem no egoísmo? E sabeis que são eles numerosos na Terra!
No começo contaram sepultá-la com a zombaria; hoje veem que
essa arma é impotente e que, sob o fogo dos sarcasmos, ela prosseguiu o
seu caminho sem tropeçar. Não acrediteis que se confessem vencidos; não,
o interesse material é tenaz. Reconhecendo que é uma potência com que
é necessário de hoje em diante contar, vão dirigir-lhe assaltos mais sérios,
mas que só servirão para melhor atestar a fraqueza deles. Uns a atacarão di-
retamente por palavras e atos, e a perseguirão até na pessoa dos seus adep-
tos, que eles se esforçarão por desalentar a poder de embaraços,
enquanto
que outros, secretamente e por caminhos disfarçados, procurarão miná-la
surdamente.
Ficai prevenidos de que a luta não está terminada; fui avisado de que
eles vão tentar um supremo esforço. Não tenhais, porém, receio: o penhor
da vitória está nesta divisa, que é a de todos os verdadeiros espíritas:
Fora
da caridade não há salvação
. Arvorai-a bem alto, porque ela é a cabeça de
Medusa para os egoístas.
A tática, posta já em prática pelos inimigos dos espíritas, mas que
eles vão empregar com novo ardor, é tentar dividi-los criando sistemas
divergentes e suscitando entre eles a desconfiança e o ciúme. Não vos dei-
xeis cair no laço, e tende como certo que quem quer que procure um
meio, qualquer que seja, para quebrar a boa harmonia, não pode ter boa
intenção. É por isso que vos recomendo useis da maior circunspeção na
formação dos vossos grupos, não somente para vossa tranquilidade, como
no próprio interesse dos vossos labores.
A natureza dos trabalhos espíritas exige calma e recolhimento. Ora,
não há recolhimento possível se se está preocupado com discussões e com
a manifestação de sentimentos malévolos. Não haverá sentimentos ma-
lévolos se houver fraternidade; não pode, porém, haver fraternidade em
egoístas, ambiciosos e orgulhosos. Entre orgulhosos, que se suscetibili-
zam e ofendem por tudo, ambiciosos que se sentirão mortificados se não
tiverem a supremacia, egoístas que não pensam senão em si, a cizânia não
pode tardar a introduzir-se, e com ela a dissolução. É o que desejariam os
nossos inimigos, e é o que eles procuram fazer.
Se um grupo quer estar em condições de ordem, de tranquilidade e
de estabilidade, é preciso que nele reine o sentimento fraternal. Todo
grupo
ou sociedade que se formar, sem ter caridade efetiva por base, não tem vi-
talidade; enquanto que aqueles que forem fundados de acordo com o ver-
dadeiro espírito da Doutrina olhar-se-ão como membros de uma mesma
família que, não sendo possível habitarem todos sob o mesmo teto, moram
em lugares diferentes. A rivalidade entre eles seria um contrassenso; ela não
poderia existir onde reina a verdadeira caridade, porque a caridade não se
pode entender de duas maneiras.
Reconhecei, pois, o verdadeiro espírita na prática da caridade por
pensamentos, palavras e obras, e persuadi-vos de quem quer que nutra em
sua alma sentimentos de animosidade, de rancor, de ódio, de inveja ou de
ciúme, mente a si próprio se tem a pretensão de compreender e praticar
o Espiritismo.
O egoísmo e o orgulho matam as sociedades particulares, como ma-
tam os povos e a sociedade em geral...”
Tudo mereceria citação nestes conselhos, tão justos quão práticos, mas
é preciso que nos limitemos, em razão do tempo de que podemos dispor.
•
A pedido dos espíritas de Lyon e de Bordeaux, Allan Kardec fez, em
setembro e outubro, uma longa viagem de propaganda semeando por toda
parte a boa-nova e prodigalizando conselhos, mas somente aos que lhos pe-
diam; o convite feito pelos grupos lioneses estava subscrito por quinhentas
assinaturas. Uma publicação especial deu conta dessa viagem de mais de seis
semanas durante a qual o mestre presidiu a mais de cinquenta reuniões em
vinte cidades, onde por toda parte foi alvo do mais cordial acolhimento e se
sentiu feliz por verificar os imensos progressos do Espiritismo.
A respeito das viagens de Allan Kardec, como certas influências hos-
tis houvessem espalhado o boato de que eram feitas a expensas da Socie-
dade Parisiense de Estudos Espíritas, sobre cujo orçamento igualmente ele
sacava de antemão todos os seus gastos de correspondência e de manuten-
ção, o mestre rebateu, assim, essa falsidade:
Várias pessoas, sobretudo na província, haviam pensado que os gastos com essas
viagens corriam por conta da Sociedade de Paris. Vimo-nos forçados a refutar
esse erro quando a ocasião se apresentou. Aos que pudessem ainda partilhar dessa
opinião, lembramos o que foi dito em outra circunstância (número de junho de
1862), que a Sociedade se limita a prover as despesas correntes e não possui reser-
vas. Para que pudesse formar um capital, teria de visar o número; é o que não faz,
nem quer fazer, pois seu objetivo não é a especulação e o número nada acrescenta à
importância de seus trabalhos. Sua influência é toda moral e o caráter de suas reu-
niões dá aos estranhos a ideia de uma assembleia grave e séria. Eis o seu mais pode-
roso meio de propaganda. Assim, não poderia ela custear semelhante despesa. Os
gastos de viagem, como todos os necessários às nossas relações com o Espiritismo,
são cobertos por nossos recursos pessoais e por nossas economias, acrescidos do
produto de nossas obras, sem o que nos seria impossível acudir a todas as despesas
consequentes à obra que empreendemos. Dizemos isto sem vaidade, unicamente
em homenagem à verdade e para edificação dos que imaginam que entesouramos.
(
Revista espírita
, novembro de 1862.
Em 1862 Allan Kardec fez também aparecer uma
Refutação às críticas
contra o espiritismo no ponto de vista do materialismo, da ciência e da religião.
10
Em abril de 1864 publicou a
Imitação do evangelho segundo o espiri-
tismo
, com a explicação das máximas morais do Cristo, sua aplicação e sua
concordância com o Espiritismo. O título dessa obra foi depois modifica-
do, e é hoje
O
evangelho segundo o espiritismo
.
Aproveitando-se da época das férias, Allan Kardec fez em setembro
de 1864 uma viagem a Antuérpia e a Bruxelas. Expondo aos espíritas belgas
o seu modo de ver acerca dos grupos e sociedades espíritas, recorda o que já
havia dito em Lyon, em 1861: “Vale mais, portanto, haver em uma cidade
cem grupos de dez a vinte adeptos, em que nenhum se arrogue a suprema-
cia sobre os outros, do que uma única sociedade que a todos reunisse. Esse
fracionamento em nada pode prejudicar a unidade dos princípios, desde
que a bandeira é uma só e que todos se dirigem para um mesmo fim.”
As sociedades numerosas têm sua razão de ser sob o ponto de vista
da propaganda, mas, quanto aos estudos sérios e continuados, é preferível
constituírem-se grupos íntimos.
No dia 1
o
de agosto de 1865, Allan Kardec fez aparecer uma nova
obra —
O céu e o inferno ou a Justiça divina segundo o espiritismo
, na qual
são mencionados numerosos exemplos da situação dos Espíritos, no mun-
do espiritual e na Terra, e as razões que motivaram essa situação.
Os admiráveis êxitos do Espiritismo, seu desenvolvimento quase in-
crível, criaram-lhe inúmeros inimigos e, à proporção que ele se foi engran-
decendo, aumentou, também, a tarefa de Allan Kardec. O mestre possuía
uma vontade de ferro, um poder de combatividade extraordinários; era
um trabalhador infatigável; de pé, em qualquer estação, desde às 4h30min,
respondia a tudo, às polêmicas veementes dirigidas contra o Espiritismo,
contra ele próprio, às numerosas correspondências que lhe eram dirigidas;
atendia à direção da
Revista espírita
e da Sociedade Parisiense de Estudos
Espíritas, à organização do Espiritismo e ao preparo das suas obras.
Esse excesso físico e intelectual esgotou-lhe o organismo, e repetidas
vezes os Espíritos precisam chamá-lo à ordem, a fim de obrigá-lo a poupar
a saúde. Ele, porém, sabe que não deve durar mais que uns dez anos ainda:
10
N.E.: Allan Kardec, no livro
Viagem espírita em 1862
, revela ter desistido da ideia de publicar o opúsculo
que anunciara um ano antes (
Revista espírita
, dezembro de 1861) e que seria intitulado
Refutação às
críticas contra o espiritismo no ponto de vista do materialismo, da ciência e da religião
numerosas comunicações o preveniram desse termo e lhe anunciaram mesmo
que a sua tarefa não seria concluída senão em nova existência, que sucederia
a breve trecho à sua próxima desencarnação; por isso ele não quer perder
ocasião alguma de dar ao Espiritismo tudo o que pode, em força e vitalidade.
Em 1867 faz uma curta viagem a Bordeaux, Tours e Orléans; em
seguida põe novamente mãos à obra, para publicar, em janeiro de 1868,
A
gênese, os milagres e as predições segundo o espiritismo
. É das mais importan-
tes esta obra, porque constitui, sob o ponto de vista científico, a síntese dos
quatro primeiros volumes já publicados.
Allan Kardec ocupa-se, em seguida, de um projeto de organização
do Espiritismo, por meio do qual espera imprimir mais vigor, mais ação à
filosofia de que se fez apóstolo, procurando desenvolver-lhe o lado prático
e fazer-lhe produzir seus frutos. O objeto constante das suas preocupações
é saber quem o substituirá em sua obra, porque sente que o desenlace está
próximo; e a constituição que elabora tem precisamente por fim prover às
necessidades futuras da Doutrina Espírita.
Desde os primeiros anos do Espiritismo, Allan Kardec havia com-
prado, com o produto das suas obras pedagógicas, 2.666 m
2
de terreno
na avenida Ségur, atrás dos Inválidos. Tendo essa compra esgotado os seus
recursos, ele contraiu com o Crédit Foncier um empréstimo de 50.000
francos para fazer construir nesse terreno seis pequenas casas, com jardim;
alimentava a doce esperança de recolher-se a uma delas, na Vila Ségur,
e torná-la-ia, depois da sua morte, asilo, a que se pudessem recolher na
velhice os defensores indigentes do Espiritismo.
Em 1869 a Sociedade Espírita era reconstituída e tornada sociedade
anônima, com o capital de 40.000 francos, dividido em quarenta ações,
para a exploração da livraria, da
Revista espírita
e das obras de Allan
Kardec.
A nova sociedade devia instalar-se no dia 1
o
de abril, à rua de Lille, n
o
7.
Allan Kardec, cujo contrato de arrendamento na passagem Sainte-
-Anne estava quase a terminar, contava retirar-se para a Vila Ségur, a fim
de trabalhar mais ativamente nas obras que lhe restava fazer e cujo plano e
documentos se achavam já reunidos. Estava, pois, em todos os preparati-
vos de mudança de domicílio, quando a 31 de março a doença de coração
que o minava surdamente pôs termo à sua robusta constituição e, como
um raio, o arrebatou à afeição dos seus discípulos. Essa perda foi imensa
para o Espiritismo, que via desaparecer o seu fundador e mais poderoso
propagandista, e lançou em profunda consternação todos os que o haviam
conhecido e amado.
Hippolyte-Léon-Denizard Rivail — Allan Kardec — faleceu em
Paris, rua e passagem Sainte-Anne, 59, 2
a
circunscrição e
mairie
de la
Banque, em 31 de março de 1869, com 65 anos, sucumbindo da ruptura
de um aneurisma.
Unânimes sentimentos acolheram a dolorosa notícia, e numerosís-
sima concorrência acompanhou ao Père-Lachaise,
11
sua derradeira mo-
rada, os despojos mortais daquele que fora Allan Kardec, daquele que,
através dos tempos, brilhará como um meteoro fulgurante na aurora do
Espiritismo.
Quatro orações foram proferidas à beira do túmulo do mestre:
a primeira, pelo Sr. Levent, em nome da Sociedade Espírita de Paris; a
segunda, pelo Sr. Camille Flammarion, que não fez somente um esbo-
ço do caráter de Allan Kardec e do papel que cabe aos seus trabalhos
no
movimento
contemporâneo, mas ainda, e sobretudo, um exame da
situação das ciências físicas, no ponto de vista do mundo invisível, das
forças naturais desconhecidas, da existência da alma e da sua indestrutibi-
lidade. Em seguida, tomou a palavra o Sr. Alexandre Delanne, em nome
dos espíritas dos centros afastados; e, depois, o Sr. E. Muller, em nome da
família e dos seus amigos, dirigiu ao morto querido os últimos adeuses.
A senhora Allan Kardec tinha 74 anos por ocasião da morte de seu
esposo. Sobreviveu-lhe até 1883, ano em que, a 21 de janeiro, se extin-
guiu, com 89 anos, sem herdeiros diretos.
Erraria quem acreditasse que, em virtude dos seus trabalhos, Allan
Kardec devia ser uma personagem sempre fria e austera. Não era, en-
tretanto, assim. Esse grave filósofo, depois de haver discutido pontos
mais difíceis da Psicologia e da Metafísica transcendental, mostrava-se
expansivo, esforçando-se por distrair os convidados que ele frequente-
mente recebia na Vila Ségur; conservando-se sempre digno e sóbrio em
suas expressões, sabia adubá-las com o nosso velho sal gaulês em rasgos de
causticante e afetuosa bonomia. Gostava de rir com esse belo riso franco,
largo e comunicativo, e possuía um talento todo particular em fazer os
outros partilharem do seu bom humor.
11
N.E.: Ver
Reformador
de abril de 1957, p. 93
Todos os jornais da época se ocuparam da morte de Allan Kardec e
procuraram medir-lhe as consequências. Eis aqui, a título de lembrança,
o que a esse respeito escrevia o Sr. Pagès de Noyez, no
Journal de Paris
, de
3 de abril de 1869:
Aquele que por tão longo tempo ocupou o mundo científico e religioso sob o
pseudônimo de Allan Kardec, chamava-se Rivail e morreu na idade de 65 anos.
Vimo-lo deitado num simples colchão, no meio da sala das sessões a que há tantos
anos ele presidia; vimo-lo com o semblante calmo como se extinguem aqueles a
quem a morte não surpreende e que, tranquilos quanto ao resultado de uma vida
honesta e laboriosamente preenchida, imprimem como que um reflexo da pureza
de sua alma sobre o corpo que abandonaram.
Resignados pela fé em uma vida melhor, e pela convicção da imortalidade da alma,
inúmeros discípulos tinham vindo lançar um derradeiro olhar àqueles lábios desco-
rados que, ainda na véspera, lhes falavam a linguagem da Terra. Mas eles recebiam já
a consolação de além-túmulo: o Espírito Allan Kardec veio dizer-lhes quais haviam
sido as suas comoções, quais as suas primeiras impressões, quais, dos que o haviam
precedido no além-túmulo, tinham vindo ajudar-lhe a alma a desprender-se da ma-
téria. Se “o estilo é o homem”, aqueles que conheceram Allan Kardec em vida não
podem deixar de ficar emocionados pela autenticidade dessa comunicação espírita.
A morte de Allan Kardec é notável por uma coincidência estranha. A Socieda-
de fundada por esse grande vulgarizador do Espiritismo acabava de desaparecer.
Abandonado o local, retirados os móveis, nada mais restava de um passado que
devia renascer sobre novas bases. No fim da última sessão, o presidente fizera as
suas despedidas; preenchida a sua missão, retirava-se da luta cotidiana, para se
consagrar inteiramente ao estudo da Filosofia espiritualista. Outros, mais jovens
— intrépidos — deveriam continuar a obra e, fortes por sua virilidade, impor a
verdade por sua convicção.
Para que referir os detalhes da morte? Que importa o modo por que se partiu o
instrumento, e por que consagrar uma linha a esses fragmentos de ora em diante
mergulhados no turbilhão imenso das moléculas? Allan Kardec morreu na sua
hora própria. Com ele terminou o prólogo de uma religião vivaz, que, irradiando
todos os dias, cedo terá iluminado toda a humanidade. Ninguém melhor que
ele podia conduzir a bom termo essa obra de propaganda, à qual era necessário
sacrificar as longas vigílias que alimentam o espírito, a paciência que educa com
o correr do tempo, a abnegação que afronta a estultícia do presente, para não ver
senão a irradiação do futuro.
Allan Kardec terá, com suas obras, fundado o dogma pressentido pelas mais anti-
gas sociedades. Seu nome, apreciado como o de um homem de bem, está há muito
tempo vulgarizado pelos que creem e pelos que receiam. É difícil praticar o bem sem
chocar os interesses estabelecidos. O Espiritismo destrói muitos abusos, reanima mui-
tas consciências doloridas, dando-lhes a certeza da prova e a consolação do futuro.
Os espíritas choram hoje o amigo que os deixa, porque o nosso entendimento, por
assim dizer, material, não se pode submeter a essa ideia de
transição
; pago, porém, o
primeiro tributo a essa inferioridade do nosso organismo, o pensador ergue a cabeça
e através desse mundo invisível, que ele sente existir além do túmulo, estende a mão
ao amigo, que já não existe, convencido de que o seu Espírito nos protege sempre.
O presidente da Sociedade Espírita de Paris está morto, mas o número de adeptos
cresce todos os dias, e os corajosos, os quais pelo respeito ao mestre se deixavam ficar
no segundo plano, não hesitarão em se evidenciarem, por bem da Grande Causa.
Esta morte, que o vulgo deixará passar indiferente, não deixa de ser, por isso, um
grande fato para a humanidade. Não é mais o sepulcro de um homem, é a pedra
tumular enchendo esse imenso vácuo que o materialismo cavara aos nossos pés e
sobre o qual o Espiritismo esparge as flores da esperança.
Um ponto sobre o qual não atraí a vossa atenção, mas que devo assi-
nalar, é a caridade verdadeiramente cristã de Allan Kardec; dele se pode dizer
que a mão esquerda ignorou sempre o bem que fazia a direita, e que esta ain-
da menos conheceu os botes que à outra atiravam aqueles para quem o reco-
nhecimento é um fardo excessivamente pesado. Cartas anônimas, insultos,
traições, difamações sistemáticas, nada foi poupado a esse intrépido lutador,
a essa alma grande e varonil que penetrou integralmente na imortalidade.
O despojo mortal de Allan Kardec repousa no Père-Lachaise, em
Paris, sob modesta lápide erigida pela piedade dos seus discípulos; é aí
que se reúnem todos os anos, desde 1869,
12
os adeptos que têm guardado
fidelidade à memória do mestre e conservam preciosamente no coração o
culto da saudade.
E já que um sentimento análogo nos reúne hoje, repitamos bem
alto, minhas senhoras, meus senhores:
Honra! Honra e glória a Allan Kardec!
13
Henri Sausse
12
N.E.: Ver
Reformador
de abril de 1957, p. 93.
13
N.T.: Conservamos no presente trabalho a forma de conferência que lhe deu o autor, lendo-a por oca-
sião da solenidade com que os espíritas de Lyon celebraram, a 31 de março de 1896, o 27
o
aniversário
do decesso de Allan Kardec
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